Na parede à sua frente residia um calendário daqueles eléctricos e antigos. As horas desdobravam-se em folhas, assim como os dias e os anos.
Sentado num “fauteill” muito surrado, fixava o olhar naquele velho aparelho. Um AVC recente havia-lhe roubado a voz e o andar e atirara-o para uma casa de repouso. Só respondia com sons roucos… e com olhares.
Porém a memória estava intacta.
A cada dia que passava no calendário ele recordava qualquer coisa na data. E se alguns dias ele permanecia sossegado, havia outros em que era um destempero de agitação.
Era o caso daquele dia 25 de Agosto. Ele olhava a data e arregalava os olhos. Depois quis chorar, mas não conseguiu.
Nesse dia recebeu a visita de um dos netos. Os olhos iluminaram-se numa alegria e por fim sossegou. O rapaz trazia uma pasta e abriu-a para o avô. Este com a mão boa passou-a pelas fotografias e olhou novamente para o neto.
- Eu sei avô, eu sei! Neste dia há vinte anos entravas tu pela primeira vez no oceano Pacífico…
Em pé, à beira-mar perscrutava o horizonte onde dois azuis distintos se uniam. A maré apresentava-se baixa, muito baixa. As pequenas ondas lambiam-me os pés. Uma gaivota voou como que fiscalizando os banhistas!
De vez em quando avançava um passo no sentido do mar. Sentia o frio da água e por ali ficava largos minutos. Assim que o corpo se habituava à temperatura evoluía mais uns metros.
Com os braços cruzados sobre o peito despido… meditava!
Finalmente decidiu-se por penetrar totalmente no mar frio. As ondas chocaram contra si, mas ele continuou. Mergulhou no mar anil. Sentiu o frio obrigando a erguer-se. Respirou fundo.
Saiu do mar. O Sol batia-lhe nas costas com força e aquecia-o. No entanto nem o calor do astro-rei nem o frio do indomável mar lhe retiraram a dúvida que ali o trouxera. Dava voltas à cabeça, revolvia o espírito. Mas nada surgia que o ajudasse.
Virou-se para o manto azul, passou a mão pelo cabelo molhado para dizer para si próprio: