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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

O fumador #3

Episódio 2

Valdemar não gostou nada da forma como a enfermeira se referiu ao defunto, no entanto deu para perceber que não seria pessoa simpática e muito menos querida. De súbito perguntou ao médico que consigo descia as escadas:

- Dr. conseguiu encontrar alguma identificação do tipo? – e lançou a cabeça para o lado apontando para a vítima. 

Não escutou qualquer resposta. Já na rua ambos retiraram as máscaras e respiraram com gosto o ar poluído da cidade.

- Nunca pensei gostar tanto de respirar ar poluído… Safa que aquilo estava agreste.

O médico provavelmente habituado a este género de odores apenas respondeu à primeira questão:

- Ninguém encontrou qualquer identificação. Nem um recibo de luz, água, qualquer coisa… E agora posso mandar levar o corpo?

- Sim, sim. Talvez passe mais tarde pela morgue.

- Se passar leva logo o tal anel!

- Isso, obrigado.

Um cumprimento simples e cada um seguiu o seu caminho não sem antes Valdemar avisar os elementos do INEM para levarem o corpo para a morgue.

Pegou então na bicicleta e estava para atravessar a fita delimitadora quando ouviu uma voz.

- Senhor, senhor…

O Inspector levantou a cabeça e percebeu que uma jovem agitava o braço para si. Aproximou-se já dos poucos mirones e questionou:

- É comigo?

- Não sei se é consigo… O senhor é polícia?

- Sou o inspector encarregue deste caso. Porquê?

- Sabe o que aconteceu ali?

- Sei mas não posso dizer… como imagina!

- É que ali vive um tio meu… de quem não sei nada há umas semanas…

Valdemar abriu os olhos e pegando no braço da jovem puxou-a para o seu lado.

- Em que andar mora?

- Mora no segundo esquerdo…

O inspector levou a mão à cabeça, olhou em redor em buscar de um sítio para se sentarem e encontrando um banco ali ficaram ambos.

- Encontrámos um corpo em avançado estado de decomposição nesse andar. Seria o seu tio?

- Oh não! – levou as mãos à cara e principiou a chorar.

Valdemar tentou amenizar a situação.

- Pode não ser ele!

- É certamente. Ele só se dava comigo pois era eu que lhe pagava as contas e lhe dava dinheiro para ele comprar o que necessitava. Como terá acontecido?

- Não sabemos menina… E como é que ele se chamava?

- Armelindo Lobato!

- Hummm! – pegou numa caneta e num papel e escreveu o nome.

Para logo a seguir insistir:

- Que idade teria?

- Praí uns 55 a 60 anos… Não sei bem… Só perguntando à minha mãe.

Agora seria a pergunta para a qual já sabia a resposta:

- Ele teria inimigos?

- Nem amigos ele tinha quanto mais inimigos!

Levantou uma nova questão para a qual também sabia a resposta, mas necessitava de uma confirmação:

- Sabe se ele fumava?

- Fumava e muito… Quase todo o dinheiro que lhe dava era para tabaco e bebida… Era um desgraçado. Tenho tanta pena dele.

- Sabe se era casado?

- Casado? – deu uma gargalhada semi triste. Devolveu:

- Quem gostaria de um homem assim?

- Pois não sei… A verdade é que tinha uma aliança no dedo!

- Uma aliança? Então não é o meu tio, com toda acerteza.

Valdemar passou a mão pela cabeça e vendo o corpo a entrar na ambulância sugeriu:

- Será capaz de o identificar?

A jovem pegou no lenço de papel, assoou-se, respirou fundo e aceitou o desafio:

- Claro! Mas creio que não será ele…

- Como é que tem a certeza disso?

Novo suspiro:

- Porque… porque… - gaguejou – o meu tio era homossexual…

O fumador #2

Episódio 1

Municiado com diversas máscaras no bolso e tendo colocado duas na face, entrou decidido no vetusto prédio. De início não sentiu o cheiro, mas depressa as máscaras foram impotentes para tamanho pivete. Todavia era o seu trabalho. Nos diversos patamares foi encontrando agentes da polícia que o cumprimentaram quase enojados com o cheiro. Quando chegou ao segundo andar ficou à porta e recebeu o primeiro choque não evitando uma expressão mais forte:

- Porra! O que é isto?

O maior realce estava no chão completamente atapetado de beatas de cigarro há muito fumadas. Não se conseguia ver o soalho verdadeiro. Como o pé foi raspando até encontrar o fundo que exposto estava obviamente negro e queimado.

Entrou devagar e o odor que mesmo com máscaras lhe chegava às narinas era quase insuportável. Uma passagem para uma sala sem porta, todavia reparou nas dobradiças ferrugentas e partidas. A sala parecia grande especialmente pelo aspecto minimalista. Encostado à parede do fundo uma velha televisão estava ligada, mas sem som. Do lado oposto um sofá em muito mau estado, um corpo morto e um especialista de volta deste. Vendo Valdemar acenou com as mãos evitando respirar aquele ambiente.

No entanto o inspector necessitava de respostas às questões que a sua mente sempre tão activa discorria. Assim aproximou-se do cadáver e mirou-o atento. Aquilo não era bonito de se ver, nada mesmo, mas não podia retirar dali o corpo sem uma inspecção atenta. Finalmente perguntou:

- Há quantos dias terá morrido?

O outro ergueu três dedos.

- Três dias?

A mão enluvada fez sinal negativo.

- Três semanas?

Finalmente tremeu numa dúvida e Valdemar percebeu que se aproximava mais da data da morte. Insistiu:

- Alguma causa evidente de morte?

Nova negação com a mão.

Valdemar olhou para algo e virando para o médico legista perguntou:

- O que é isso nessa mão? Parece um anel..

Um polegar para cima confirmou a ideia do inspector.

- Consegues tirar?

Nova negação!

- Ok! Depois envia-me essa aliança para mim. Pode ser importante. Vou ver o resto do apartamento.

O médico ergueu-se e fez um sinal para que não fosse. Só que o inspector não gostava de deixar as coisas para trás e seguiu por um corredor. O chão continuava macio de pontas de cigarros e ao fundo à esquerda entrou no que parecia ser a cozinha. Quase deu um salto.

- Safa... parece uma estrumeira! Como pode alguém viver num sítio destes.

Continuou a inspecção e quando saiu encontrou o médico legista que também abandonava o local. Chegados ao patamar das escadas encontrarem uma jovem que carregava uma mala às costas. O inspector estranhou aquela personagem, mas lembrou-se da vizinha acamada. Por isso apenas perguntou:

- Vem para a D. Efigénia?

- Venho sim… Lá na Associação estamos sempre a vê-la de forma remota, mas hoje parece mais agitada que o costume. Daí estar aqui… Já agora que se passou e que cheiro pestilento é este?

- O vizinho… da frente…

- Morreu?

- Sim, parece que há umas semanas e ninguém deu por nada! Alguma vez se cruzou com ele?

- Raramente e cruzei-me sempre que ia a descer e ele vinha a subir.

- Ele algumas vez disse alguma coisa?

- Sinceramente?

Valdemar estranhou a última questão e só soube dizer:

- Claro!

- Grunhiu!

O fumador!

O monte de processos e demais papelada teimava em não desaparecer. Anos e casos a mais sem relatórios e, pior que tudo, sem arquivo. Agora Aquiles dera-lhe apenas uma semana para limpar a secretária… Com a condição de não ser chamado para nenhum caso. Apenas um trabalho das nove ás cinco da tarde que Valdemar olimpicamente detestava.

Tocou o velho telefone algures na mesa, escondido sob arráteis de papéis. O aparelho calou-se. O inspector suspirou para logo a seguir:

- Valdemar! – soou em toda a sala.

O inspector ergueu-se por detrás de um monitor do tempo jurássico e respondeu:

- Diga chefe!

- Porque não atendes a porra do telefone?

- Já lá ía…

- Vem ao meu gabinete, rápido!

O jovem inspector detestava aquele tom de voz e preparou-se para algo que certamente não iria gostar. Entrou no aquário de vidro e alumínio, fechou a porta devagar e aguardou:

- Preciso de ti para um caso…

- Mas o chef…

- Eu sei, eu sei… mas este caso precisa de ti! - interrompeu.

- Fónix Aquiles assim nunca mais despacho aquela papelada.

- Pega nas perninhas e vais a esta morada… Esperam-te lá. Se quiseres um carro leva-te, sempre chegas mais depressa.

Valdemar olhou a morada, arregalou os olhos e exclamou:

- Olha esta rua é duas acima da minha. Vou na minha bicicleta.

- Vai, desanda daqui.

No fundo o inspector estava feliz. Odiava papéis e sair daquela sala era uma alegria. Todavia não o poderia confessar ao chefe. Desceu as escadas e saiu até à rua. Tirou a chave do cadeado do bolso, destrancou-o e saltou para o selim da sua bicicleta. Num ápice chegou ao destino.

Como previa uma multidão rodeava o círculo que a polícia fizera com fitas azuis e brancas. Do outro lado da rua carros de Bombeiros, uma ambulância do INEM e diversas viaturas da Polícia. Foi passando devagar por entre os mirones puxando a sua duas rodas até que se aproximou do limite. Como de costume perguntou:

- O que se passou?

O olheiro do lado colocou a mão na garganta e num tom de voz esquisito respondeu:

- Apanharam um tipo a fumar dentro do prédio…

Valdemar ergueu o sobrolho e quase riu. Depois levantou a cinta e passou. Atrás de si escutou:

- Olhe que não pode passar…

Valdemar cumprimentou o primeiro polícia com um aperto de mão:

- Estás bom Gomes?

- Inspector… bom dia! Voltaste à Terra? Ainda por cima de bicicleta…

- Não gozes, pá, não gozes! Estava fartinho dos papéis. Ainda vou ter de agradecer ao criminoso. Sabes do que se trata?

- Um tipo que está morto há semanas e ninguém deu por falta…

- Obrigado!

Em passo decidido Valdemar aproximou-se do prédio onde à porta diversas pessoas trocavam impressões.

- Bom dia – de cartão identificou-se, para completar – sou o inspector Valdemar e algum dos senhores mora neste prédio.

Um homem alto, de cabelos alvos e voz firme avançou, respondendo:

- Moramos todos. Fui eu que chamei os Bombeiros devido ao mau cheiro…

- Muito bem. Em que andar está o corpo?

- No segundo esquerdo.

- Obrigado! E enquanto o corpo não for levado não devem entrar. Desculpem o incómodo, mas tem de ser assim.

O idoso morador ainda acrescentou:

- Diga isso à D. Efigénia que está acamada há três anos!

Valdemar percebeu que gozava dele e voltando para trás encostou o dedo no peito do idoso e perguntou:

- Como é que sei que não foi o senhor que o matou?

O velho engoliu em seco, arrepiou caminho e num ápice percebeu que falara demais e devolveu:

- Desculpe senhor inspector!

- Assim que me despachar eu aviso.

Um bombeiro vinha a sair de máscara na cara. Valdemar interpelou-o:

- Tem alguma máscara para mim?

- Não, acabaram-se… Mas olhe que vai precisar… aquilo não está fácil!

Valdemar abanou a cabeça contrariado e aproximou-me de uma patrulha.

- Tem uma máscara que me dê?

O agente olhou-o, mas não o conhecendo, perguntou:

- Para que quer a máscara?

Valdemar quase que espumava de raiva e mostrou o cartão de inspector:

- Chega?

 

Episódio 2

Os Felícios! #12

Resposta a este convite da Ana

Episódio 1

Episódio 2

Episódio 3

Episódio 4

Episódio 5

Episódio 6

Episódio 7

Episódio 8

Episódio 9

Episódio 10

Episódio 11

Eram três e vinte e cinco da madrugada quando um grito soou em toda a casa. Bom na casa, no prédio e nos edifícios contíguos. Houve quem afirmasse que o senhor Cassildo, um brasileiro bem pachola que vivia duas ruas abaixo, também ouvira o grito.

Felícia levanta-se de um salto ao escutar o berro da filha e corre para o quarto. Entra sem bater e encontra Maria Felícia já sentada na cama com as pernas em vê e uma mancha de água que se alastrava lentamente pelos lençóis.

- Está na hora, filha – disse para a rapariga. Depois dirigiu-se ao guarda-fato e retirou de lá um enorme saco que havia preparado para aquele momento.

À entrada do quarto surgiu também Felício que estremunhado perguntava:

- Que se passa? É preciso alguma coisa?

- A tua filha está pronta para dar à luz. Se queres ser útil arranja-me um táxi.

- Táxi a esta hora? Onde vou arranjar um agora?

Felícia responde em tom áspero:

- Que tal o teu? Achas que consegues chegar ao hospital?

O futuro avô dá uma palmada na testa e devolve:

- Tens razão. Vou já buscá-lo.

Antes de sair avisou:

- Quando estiver à porta toco a campainha.

- Tocas nada homem! Acordas toda a gente… Sabes que horas são… Bem bastou já o grito estridente que a tua filha deu. Eu vou descendo com ela devagar. Dará tempo.

Já no carro e quiçá por defeito de profissão, Felício pergunta:

- Para que hospital vamos?

- O que for mais perto… isso pergunta-se?

Todavia o primeiro hospital não aceitou a parturiente por não ter essa especialidade e de lá correram para outro que aceitaram a futura mãe. Nas urgências o médico de serviço perguntou de forma inocente à futura avó:

- O pai da criança?

Encavacada com a questão Felícia acabou por responder, mentindo:

- Está... está em viagem… mas eu fico com ela!

- Não é preciso! Está bem entregue. Vá para casa qu’isto pode demorar. Depois diremos alguma coisa.

- Eu fico aqui à espera.

- Olhe que pode demorar… - insistiu no aviso, o médico.

- Não importa… - naquele momento a porta automática fechou-se à sua frente e a filha desapareceu noutro mundo.

Sentou-se na sala de espera onde já estava Felício dormitando e deu-lhe a mão nervosa. Depois olhou-o e sorriu.

- Vamos ser avós, já viste?

- E de um catraio… - assumiu o táxista.

- Lá estás tu com essa teimosia… Que coisa a tua…

O tempo passou devagar. Encostados um ao outro os velhos Felícios dormitavam quando escutaram:

- Acompanhante de Maria Felícia…

A avó acorda assarapantada, mas levanta-se num ápice e dirige-se à pessoa que a chamara:

- Estou aqui… há novidades, senhor Doutor?

- Há sim! E boas!

- Ai Deus Nosso Senhor me ajude… e a ela também – agradeceu Felícia enquanto se persignava.

- Olhe que bem precisam…

- Ai… mas porque diz isso?

- Porque tem ali dois netos fantásticos. Ou melhor um neto e uma neta!

Felício que se aproximara abraçou a mulher e escutando as derradeiras palavras afirmou vaidoso:

- Eu não disse… amanhã vou preencher a proposta de sócio do Feliciano.

- Então e a Felicidade Maria?

- Vai ser sócia também!

Nesse momento entrou Mário Felício na sala de espera com ar esbaforido e vendo os pais, já nem usa o uotessape e questiona:

- Há novidades, há novidades?

Responde o agora avô:

- És um bi tio!

- Sou o quê?

Avança a mãe:

- A tua irmã teve gêmeos!

- Dois?

- Sim dois... E já chegam, não? - devolve Felícia!

- Então já sei quem é o pai das crianças...

- Quem é, quem é? - Perguntam em uníssono os pais.

- O Cabé que tem uma irmã gêmea... - naquele preciso instante a voz de Mário Felício foi perdendo fulgor, para finalmente acrescentar - que é a minha namorada e também está grávida.

- Ai... - suspira a mãe arregalando os olhos para o marido.

Felício no alto do seu clubismo afirma todo contente:

- Amanhã já vou buscar quatro propostas para sócios.

 

FIM

Os Felícios! #11

Resposta a este convite da Ana

Episódio 1

Episódio 2

Episódio 3

Episódio 4

Episódio 5

Episódio 6

Episódio 7

Episódio 8

Episódio 9

Episódio 10

A certeza do aumento da família, cada vez mais visível no ventre arredondado de Maria Felícia, transformou totalmente o ambiente caseiro dos Felícios.

De lado ficaram definitivamente os telemóveis e o respectivo uotessape. Apenas Mário Felício ainda o usou durante umas semanas numa tentativa de falar com alguém de casa, mas como não obteve qualquer resposta acabou por desistir. Também se tornou curiosa a sua relação com a irmã, tantas vezes comparsa de festas e saídas nocturnas e agora sentia-a como ela fosse… uma estranha.

Na verdade Mário Felício não sabia ou não queria saber da gravidez da irmã e fazia todos os possíveis para se desencontrar dela.

Ao invés, o futuro avô Felício parecia andar nas nuvens. Na praça onde normalmente costumava parar o táxi pela manhã, já todos sabiam da novidade natalícia. Alguns ousavam chegar mais longe através de brincadeiras parvas e dichotes a que Felício respondia, por vezes a rir e outras com maus modos. Apostava todavia que a futura criança seria um rapaz e às dúvidas apresentadas pelos seus colegas, respondia invariavelmente:

- Lá em casa quem mando sou eu. Se digo que vai ser um rapaz… é um rapaz, mai'nada! Assim que ele nascer faço-o logo sócio do meu clube…

Houve mesmo quem lançasse uma ideia entre o machismo e o imbecil:

- E se for uma cachopa Felício? Também a fazes sócia do teu clube?

Resposta pronta:

- Obviamente! Antes do meu que do teu…

Entretanto Felícia aceitara mais uns trabalhitos de forma a “apouchar” mais uns euros para poder comprar coisas para a criança. Havia muito tempo que a roupa pequena dos filhos fora entregue a uma prima, mãe de uma ranchada de catraios.

Com o dinheiro ganho já comprara um berço, um marsúpio, um fraldário, uma banheira e algumas roupas. Todavia a filha parecia ainda não estar ainda bem consciente do seu estado e daí gastar mais dinheiro em vestimentas para esconder a gravidez do que em utilidades para a futura criança.

Certa noite, à mesa, a mãe sente que tem de fazer uma pergunta à filha. Teme, todavia, a sua reacção já que Maria Felícia tem um feitio… meio esturrado! Respira fundo e finalmente propõe-se a questionar:

- Filha, posso saber uma coisa?

A futura parturiente rabisca qualquer coisa num guardanapo usado com um lápis que apanhou algures e responde quase por instinto:

- Diz lá mãe…

Um silêncio entrou na cozinha de odores vários e finalmente:

- Quem é o pai dessa criança?

Maria Felícia ergue-se devagar da desengonçada cadeira e dirige-se em passo lento para o corredor parecendo fugir a dar uma resposta. Por fim devolve:

- Nem eu sei… mãe. Aquela noite foi… absolutamente inesquecível! Como podes ver - e apontou para o ventre dilatado.

A mãe leva a mão à boca estupefacta com a resposta e desabafa:

- Santo Deus… que família mais destrambelhada esta!

Desgarrada de Carnaval!

Vamos brincar Carnaval

Lançam os foliões.

Que ninguém leva a mal

Nem ricos nem pobretões.

 

Prefiro estar longe

Da malta brincalhona.

Antes eremita ou monge,

Que ouvir uma sanfona.

 

Não ouso negar não

As máscaras dif’rentes.

As de Veneza então

São belas, valentes.

 

Fica assim lançado

Mais este desafio

Nem cantiga nem fado

Talvez um assobio.

 

Nota:

quem quiser participar pode fazê-lo com uma ou mais quadras através de um comentário neste blogue, através do seu próprio blogue (se o tiver) com referência a este desafio ou enviar mail para josedaxa@sapo.pt. Tanto nos comentários como por mail ou nos blogues eu acabarei por juntar aqui a(s) quadra(s). Assim ficará mais visível. Vamos lá então escrever!

 

Respostas:

Beatriz Costa

O José desafia e o pessoal não quer falhar
Ele é um craque com as palavras, mas eu também vou tentar
De palhaços está o mundo cheio, dizem as bocas das gentes
Eu cá acho que o mundo está cheio de charlatões que não sabem estar contentes

A minha resposta

Desafiar não dói

Quem o diz, muito sabe.

Não quero ser herói

Rir antes que desabe.

Os Felícios! #10

Resposta a este convite da Ana

Episódio 1

Episódio 2

Episódio 3

Episódio 4

Episódio 5

Episódio 6

Episódio 7

Episódio 8

Episódio 9

O ambiente em casa da família Felício não era o melhor, principalmente desde as festas natalícias onde ninguém recebeu o que gostaria de ter recebido.

De tal forma as coisas estavam desconfiguradas que as refeições faziam-se sempre aos pares. Primeiro pai e mãe e mais tarde os filhos. O grupo de uotessape que havia sido criado deixou de ter actividade.

Na véspera do Ano Novo, Maria Felícia e Mário Felício saíram de casa sem sequer se despedirem dos pais. O pai ficou tão furibundo que nunca mais falou aos filhos.

É neste mundo azedo que vamos reencontrar a família Felício com o pai a chegar agora mais tarde porque os tais “uberes” faziam grande concorrência aos taxistas originando que os clientes fossem muito menos. Valiam, ainda assim, algumas avenças previamente contratadas …

Felícia passou a lavar as escadas do prédio abichando com isso algum dinheiro que ajudava nas contas. Entretanto os filhos continuavam a viver lá em casa, mas sem qualquer compromisso financeiro… E como estava tudo de “telhas às avessas” também a roupa dos jovens deixou de ser lavada e passada a ferro. Amontoava-se à porta dos quartos.

Resumindo naquela casa a confusão era generalizada!

Certa noite Felícia escreveu para o marido:

- O jantar está na mesa!

- Vou já, vou só lavar as mãos!

Durante a refeição só se escutava os talheres a bater nos pratos. Mas há muito que era assim… Todavia o peso da ausência dos filhos tornava aquele momento ainda mais triste. Foi a mulher que munindo-se da maior coragem que tinha, tocou no braço do marido, chamando-o à atenção, dizendo:

- Temos de acabar com isto – e apontou para o telemóvel.

- Porquê?

- Porque somos pessoas e não máquinas…

O marido nada disse. Para depois acrescentar:

- E eles? – e fez um jeito com a cabeça apontando para dentro de casa referindo-se aos filhos.

- Eles? Façam o que quiserem. São maiores e vacinados!

Novo estranho silêncio. Entretanto a porta de entrada abriu-se. Felícia olhou o relógio de parede a pilhas, de origem chinesa e estranhou a chegada de qualquer dos filhos àquela hora.

No momento seguinte apareceu na cozinha Maria Felícia com uma cara que parecia ter sido atropelada. Olheiras enormes onde se percebia a maquilhagem toda esborratada, o cabelo desgrenhado e as mãos numa tremedeira parecida a quem sofre de “delirium tremens”.
Admirados com aquele aspecto físico e psicológico os pais levantaram-se rapidamente da mesa e chegando perto da filha perguntaram de viva voz:

- O que passa Maria Felícia?

A jovem sentou-se devagar na cadeira, mas não respondeu. Escondeu a face suja entre as mãos e desatou a chorar.

A mãe foi buscar um copo com água e deu-lhe a beber. Finalmente sentou-se a seu lado e voltou a questionar:

- O que se passa contigo?

A filha ergueu o olhar para a mãe e respondeu:

- Há um novo Felício a caminho!

Primeiro o choque depois a alegria:

- Que bom, querida. Estamos mais ricos…

- Pois dizes tu… - devolveu a filha.

Depois rematou:

- Que telemóvel vou dar eu à criança? Não sei o que fazer!

Os Felícios! #9

Resposta a este convite da Ana

Episódio 1

Episódio 2

Episódio 3

Episódio 4

Episódio 5

Episódio 6

Episódio 7

Episódio 8

O Natal aproximava-se à velocidade de uma bota de sete léguas como rezava a antiga estória de Perrault!  Por isso Mário Felício e Maria Felícia andavam numa fona desde o início do mês de Dezembro com óbvias referências ao que gostariam de ter no Natal próximo.

De vez em quando a menina mais nova escrevia no uotessape: Desculpem algum erro, mas este aparelho já deu o que tinha para dar... Tenho de ver se arranjo outro nem que seja em segunda mão (Maria Felícia sabia do pânico que a mãe tinha em comprar coisas em segunda mão!).

Mário Felício pelo seu lado era mais subtil e respondia assim à irmã: Não sejas idiota... esse telemóvel terá pr'aí um ano. Se tivesse uma consola para jogos com cinco anos... ainda terias razão.
Entretanto Felício e Felícia faziam-se de surdos e cegos não dando qualquer seguimento às conversas dos filhos.

Na verdade pagavam da mesma moeda que os infantes haviam entregue aos pais aquando da campanha da azeitona, de má memória.

O Natal chegou enfim com a costumada alegria da época. Alguns acepipes na mesa, uma garrafa de tinto daquele especial que Maria Felícia trouxera do supermercado onde havia semanas era caixeira e uma lampreia de ovos, o doce preferido do chefe do clã.

A família Felício não fugiu à ancestral tradição e logo pela manhã a troupe juntou-se de volta da árvore de Natal pouco iluminada. No chão ao redor sapatos velhos, mal cheirosos e uns embrulhos.

Mário foi o primeiro a pegar na prenda que encontrou sob o seu sapato rôto. No entanto achou estranho que não fosse uma caixa maior, mas imaginou alguma brincadeira familiar.

Rasgou o papel colorido e logo percebeu que não teria o que imaginara. Ao invés desembrulhou um belíssimo cachecol de malha do Clube Desportivo e Cultural de Alguidares de Baixo.

Uma fúria nasceu dentro de si justamente quando a mana viu a sua prenda e ria a bom rir.

Mas quando Maria foi abrir a sua e descobriu que em vez de um novo telemóvel (como quase pedira!) recebera um conjunto de costura, rapidamente perdeu o sorriso para enorme gáudio do irmão. 

No mesmo instante ambos olharam o casal de pais. Estes riam apenas.

Depois o Felício escreveu:

- Feliz Natal. Bonitas prendas, hem!

Logo veio a resposta. Mário primeiro:

- Tens cá uma graça!

Seguiu-se Maria:

- Sim, muito bonita a minha prenda. Tal qual a tua cara.

Entretanto Felícia abre a sua prenda e encontra um avental todo giraço!

Mas para o pai estaria guardado o melhor naco de fantasia. Aberto o embrulho o táxista encontra uma capa para o seu telemóvel.

- Boa malha! - escreve no uotessape.

Depois abre o involucro e constata que este tem o símbolo do clube que Felicio detesta.

Recua dois passos, deixa cair todo o corpo no velho sofá enquanto diz em tom furibundo:

- Que gentinha velhaca!