O Pastor #9
(... Continuação daqui)
Já noite a mãe surgiu no barracão onde o jovem pastor se via no meio do rebando.
- Filho, podes aqui chegar? O teu pai não me contou nada sobre a ida lá à Quinta...
Puxando por uma ovelha grande, o pastor aproximou-se da mãe que mal se via na escuridão e comunicou-lhe:
- Estou a tratar do negócio...
- Não me digas que sempre vais entregar o rebanho todo?
- Consegui ficar com o rebanho, mas tenho de devolver o que falta do dinheiro em gado...
- E quantas ovelhas serão?
- Cinco...
A ovelha deu um esticão, mas o pastor não a largou.
- Estou a marcar as cinco que devo entregar amanhã.
- Ai Graças a Deus - e colocou as mãos em oração olhando o céu negro - E o teu pai, o que disse?
- Nada mãe, nada!
Havia algo no coração que necessitava dizer à mãe. Mas temia o resultado ou reacção da antecessora. Veio para a rua sempre a puxar pela ovelha e aproveitando a Lua deu-lhe uma pincelada com uma cor no pescoço. Por fim largou-a e esta regressou ao meio do rebanho.
- Temos de falar mãe!
- O que se passa agora!
- O pai tem de ir trabalhar... ganhar o seu sustento... Eu não vou andar aqui a vida toda com o gado para ele gastar os poucos tostões na taberna... Nem pense.
A mãe virou as costas ao filho. Sabia que ele tinha razão, mas agora dizê-lo ao casmurro e bruto do marido... Depois:
- Sei que vai ser difícil, mas pode ser que este caso o tenha acordado para a realidade.
- Mãe, acorde! Se não se impuser ele vai continuar a gastar o dinheiro sem destino. Encoste-o à parede... Sem dinheiro dele... não há comida...
- Filho, filho, tu achas que seria capaz de deixar o teu pai morrer à fome? Nunca na vida...
Principiou a chorar, num pranto baixo, mas que não passou despercebido ao filho varão. O rapaz aproximou-se segurou-a nos ombros e aproveitando novamente a luz lunar, confrontou-a:
- Mas vai deixar morrer os filhos…
O pranto era agora bem maior. Embrulhou as mãos no xaile e partiu do curral. Já no cimo da pequena encosta que dava acesso ao caminho ainda disse:
- Vou vender as coisas que herdei dos meus pais... à fome ninguém há-de morrer!
O filho largou a cancela e correu atrás da mãe e voltou-lhe a dizer:
- Não vende nada. E depois quando não tiver mais nada para vender? Mãe... o pai precisa de uma lição. E se não lha der... dou-lhe eu!
- Ai filho que vais desgraçar a nossa família... Não faças nada... Por enquanto... Deixa-me falar com o teu pai primeiro!
Regressou ao carreiro e quase correu caminho fora. Entretanto o jovem pegou no tarro com leite e seguiu em passo lento para casa.
(Continua...)