O fumador #3
Valdemar não gostou nada da forma como a enfermeira se referiu ao defunto, no entanto deu para perceber que não seria pessoa simpática e muito menos querida. De súbito perguntou ao médico que consigo descia as escadas:
- Dr. conseguiu encontrar alguma identificação do tipo? – e lançou a cabeça para o lado apontando para a vítima.
Não escutou qualquer resposta. Já na rua ambos retiraram as máscaras e respiraram com gosto o ar poluído da cidade.
- Nunca pensei gostar tanto de respirar ar poluído… Safa que aquilo estava agreste.
O médico provavelmente habituado a este género de odores apenas respondeu à primeira questão:
- Ninguém encontrou qualquer identificação. Nem um recibo de luz, água, qualquer coisa… E agora posso mandar levar o corpo?
- Sim, sim. Talvez passe mais tarde pela morgue.
- Se passar leva logo o tal anel!
- Isso, obrigado.
Um cumprimento simples e cada um seguiu o seu caminho não sem antes Valdemar avisar os elementos do INEM para levarem o corpo para a morgue.
Pegou então na bicicleta e estava para atravessar a fita delimitadora quando ouviu uma voz.
- Senhor, senhor…
O Inspector levantou a cabeça e percebeu que uma jovem agitava o braço para si. Aproximou-se já dos poucos mirones e questionou:
- É comigo?
- Não sei se é consigo… O senhor é polícia?
- Sou o inspector encarregue deste caso. Porquê?
- Sabe o que aconteceu ali?
- Sei mas não posso dizer… como imagina!
- É que ali vive um tio meu… de quem não sei nada há umas semanas…
Valdemar abriu os olhos e pegando no braço da jovem puxou-a para o seu lado.
- Em que andar mora?
- Mora no segundo esquerdo…
O inspector levou a mão à cabeça, olhou em redor em buscar de um sítio para se sentarem e encontrando um banco ali ficaram ambos.
- Encontrámos um corpo em avançado estado de decomposição nesse andar. Seria o seu tio?
- Oh não! – levou as mãos à cara e principiou a chorar.
Valdemar tentou amenizar a situação.
- Pode não ser ele!
- É certamente. Ele só se dava comigo pois era eu que lhe pagava as contas e lhe dava dinheiro para ele comprar o que necessitava. Como terá acontecido?
- Não sabemos menina… E como é que ele se chamava?
- Armelindo Lobato!
- Hummm! – pegou numa caneta e num papel e escreveu o nome.
Para logo a seguir insistir:
- Que idade teria?
- Praí uns 55 a 60 anos… Não sei bem… Só perguntando à minha mãe.
Agora seria a pergunta para a qual já sabia a resposta:
- Ele teria inimigos?
- Nem amigos ele tinha quanto mais inimigos!
Levantou uma nova questão para a qual também sabia a resposta, mas necessitava de uma confirmação:
- Sabe se ele fumava?
- Fumava e muito… Quase todo o dinheiro que lhe dava era para tabaco e bebida… Era um desgraçado. Tenho tanta pena dele.
- Sabe se era casado?
- Casado? – deu uma gargalhada semi triste. Devolveu:
- Quem gostaria de um homem assim?
- Pois não sei… A verdade é que tinha uma aliança no dedo!
- Uma aliança? Então não é o meu tio, com toda acerteza.
Valdemar passou a mão pela cabeça e vendo o corpo a entrar na ambulância sugeriu:
- Será capaz de o identificar?
A jovem pegou no lenço de papel, assoou-se, respirou fundo e aceitou o desafio:
- Claro! Mas creio que não será ele…
- Como é que tem a certeza disso?
Novo suspiro:
- Porque… porque… - gaguejou – o meu tio era homossexual…