O Avô Natal
Resposta a este desafio
Olhou o vetusto relógio que nunca dormia nem necessitava de corda, estrategicamente colocado num corredor de pedra, do velho castelo e percebeu que o patrão ainda não aparecera nessa manhã. Era a primeira vez que o São Nicolau não acordava primeiro que toda a gente.
Era véspera de Natal e o velhote atrasara-se.
O secretário do Pai Natal era um homem assaz baixo, muito gordo, caminhando com passos rápidos e curtos. Talvez por isso parecia que corria ou rebolava e daí ser conhecido entre todos pelo Rebola. De farta barba cinza, havia no Castelo quem jurasse a pés juntos que o secretário era mais velho que o próprio Pai Natal, contudo ninguém tinha coragem de lhe perguntar a idade. Sempre pronto para uma boa briga com o pessoal, só o São Nicolau conseguia dizer-lhe ou pedir coisas sem escutar dele uma só palavra de azedume.
Naquela manhã Rebola aproximou-se preocupado do quarto do Pai Natal e encostou as suas enormes orelhas à porta. Não ouvindo qualquer barulho começou a clamar pelo patrão de uma forma muito peculiar. Iniciou a arranhar com as sujas unhas a porta do quarto enquanto chamava:
- São Nicolau… São Nicolau…
O silêncio manteve-se. Então o idoso secretário encostou as suas mãos sujas ao puxador e rodou devagar. O trinco mexeu-se até que fez aquele costumado som da lingueta a correr deixando finalmente a porta aberta.
Pé ante pé, Rebola aproximou-se da cama do Pai Natal! Para finalmente o encontrar de bruços na esteira.
- Pai Natal, Pai Natal – chamou em voz alta rebolando-o. Parecia inanimado… Ou seria que estava… a dormir!
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Na neve alva e funda percebia-se um rasto de pegadas que se dirigia para o Bosque Encantado. Rebola corria o mais que as pequenas pernas deixavam. De vez em quando parava para retomar fôlego. Até que chegou ao seu destino.
Era uma velha barraca naquela altura quase toda rodeada de neve. Todavia da chaminé saía um fumo espesso e cinzento. Com alguma dificuldade aproximou-se da porta de madeira à qual bateu com força. Ao fim de um bom bocado a porta finalmente abriu-se e surgiu um homem enorme, muito mais alto que o Pai Natal, de uma barba tão comprida que ultrapassava a própria cintura.
- Bom dia São Lau…
O anfitrião tossiu um pouco e depois perguntou:
- Quem és tu?
- Já não me conhece? Sou o secretário do pai Natal. Sou eu que faço as encomendas das crianças para depois o São Nicolau ir distribuir..
- Tu és o Rebola?
O outro fico furibundo com a pergunta, mas foi respondendo:
- Sim…
- Entra então… que aí está frio.
O pequeno homem entrou e correu para a lareira para se aquecer. Depois disse:
- Preciso da sua ajuda!
- Da minha ajuda? Para quê?
- O São Nicolau… o seu filho adoeceu hoje de manhã e até à hora que sai do Castelo ainda não se tinha levantado da cama. E preciso que ele se despache pois as crianças estão à espera dele…
- Mas onde andou esse mariola para ficar assim?
- Isso eu não sei São Lau, mas que preciso de si para o substituir, é verdade…
- Olha’meste agora! Então não querem lá ver que tenho a consoada estragada?
A coisa parecia estar complicada e o secretário Rebola já estava a imaginar as noticias no dia seguinte:
“Pai Natal falha entregas”
“Onde andará o Pai Natal?”
Para os mais sensacionalistas afirmarem sem certezas:
“Pai Natal apanhado pelo covid”
“Pai Natal preso por aliciar crianças”
Rebola estremeceu só de pensar. Não lhe apetecia ir novamente para a neve, mas teria de arranjar maneira de levar o avô Natal com ele. Puxou da sua postura que sempre mostrava aos seus súbditos no castelo para ordenar:
- São Lau pegue nas suas coisas e siga-me faxavor! Não tenho tempo para birras de menino. Vá, vamos lá.
Colocou-se a trás do velho e empurrou-o com força. Só que este devido ao peso e ao tamanho não se moveu um milímetro, para finalmente dizer:
- Tu és aborrecido… sabias?
- E você um parvo…
O outro enfureceu-se e quis correr atrás de Rebola que mesmo com passos pequeninos conseguiu fugir para a rua onde o seguiu.
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A perseguição durou até ao castelo onde finalmente o velho Lau entrou e procurou o filho. Chegado ao quarto encontrou o seu infante deitado na cama, mas acordado. Aproximou-se e naquele tom rude perguntou:
- Então isto são horas de estar na cama na véspera de Natal?
O outro gemeu e admirado e ver o pai, respondeu:
- Estou doente… que faz aqui meu pai?
- Vou fazer o trabalho que te competia.
Entretanto Rebola aproximou-se do Pai Natal e disse baixinho:
- Desculpe ter ido buscar o seu pai, mas o problema não é as crianças ficarem sem prendas…
- Ai não? – intrometeu-se o mais velho.
- Não…
- Então qual o problema?
- São as crianças deixarem de acreditar em vocês. Já imaginou uma criança sem qualquer crença no Pai Natal? Era uma tristeza.
O velho Lau respirou fundo, percebeu a dica e finalmente ditou a sentença:
- Uma coisa é certa… posso ir… mas vou vestido de azul! Nada dessas cores encarnadas...
Rebola sorriu sozinho, esfregou as mãos, virou as costas a ambos e foi carregar os trenós de prendas!