Mataram o Pai Natal - II
(... continuaçáo daqui e em resposta a isto)
Acordou com o som de vozes. Abriu os olhos e deu logo de caras com o monitor do seu velho e obsoleto computador onde passavam umas bolas. Num gesto rápido ergueu o corpo da secretária com medo que alguém o visse naquele estado.
Espreguiçou-se com prazer, bocejou, flectiu as pernas e por fim voltou a sentar-se. Enterrou a cabeça entre as mãos enquanto perguntava:
- Mas o que me aconteceu ontem?
Olhou para o lado e ainda lá estava o que deveria ter sido a sua consoada.
- Nem jantei…
As vozes aproximavam-se… Seriam os colegas que entravam de manhã. Buscou o telemóvel e ao ver 7 e 35 da manhã ainda mais se espantou. Procurou as chamadas e nenhuma para o chefe Baptista.
- Ai… será que estou louco?
Os colegas entraram de rompante e ao darem de caras com Olegário cumprimentaram:
- Bom dia, Feliz Natal
- Ah bom dia…
- Ficaste aqui toda a noite?
Seria prudente dizer a verdade.
- Sim fiquei… tinha aí uns processos complicados… Depois não tenho ninguém em casa e a brigada não pode ficar aqui deserta…
- Olha não pode, diz este.
- Sabe-se lá que crimes se podem cometer na calada da noite… Há gente capaz de tudo.
O outro inspector aproximou-se e imitando com os dedos um auscultador telefónico foi glosando:
- Está lá… é da brigada criminal? Sou o agente…, sei lá, Galante e pretendo comunicar um crime na rua. Mataram o Pai Natal!
Desfez a brincadeira das mãos e deu uma sonora gargalhada. Olegário assustou-se:
- Tu não brinques com isso…
Desligando-se instantaneamente da galhofa o outro perguntou:
- Olha lá ficas por cá ou vais para casa?
Desde que a Ercília morrera, havia mais de cinco anos, e antes dela a partida da filha para parte incerta, que o Inspector sentia estes dias festivos como uma faca no seu frágil coração. Por isso devolveu:
- Vou acabar aqui umas coisas e depois vou para casa.
- Boa… vai descansar que bem precisas. Pareces que foste chamado a meio da noite para tomares conta de um caso! Estás um caco!
- Sim vou embora. E não faço mais nada!
Desligou o computador, vestiu o sobretudo, pegou no saco que deveria ser da ceia e agora seria de almoço e saiu para a rua.
Um vento frio, gelado soprava com força obrigando-o a apertar o sobretudo contra o corpo. O movimento citadino era quase nulo e rapidamente chegou a casa. Estacionou o carro, retirou algumas coisas entre elas o saco com víveres e entrou no prédio.
Como não gostava de elevador subiu os três andares pelas escadas. Mas foi com um misto de espanto e dúvida que viu no patamar do seu andar duas pessoas que pareciam esperar alguém. Quando a mulher se virou Olegário pareceu ver outra vez a mulher.
- Pai…
- Filha…
- Este é o seu neto António!
O jovem aproximou-se do avô que nunca conhecera e abraçou-o. Olegário olhou para uma pequena janela nas escadas e tentou ver o céu azul. Depois disse para consigo:
- Não mataram o Pai Natal! Ainda bem!
FIM