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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Hoje convido eu! #7

A desafiarem-me!

A Di do blogue 1mulher apresentou-me a seguinte sugestão para estes desafios de escrita que vou desfiando: vale tudo na vida?

Um tema sempre actual e que me deu muuuuuuuuuuuuuuuuuuuuito que pensar. Depois peguei num exemplo real, fiz algumas modificações e "voilá"!

 

Bateu duas vezes na porta maciça e aguardou.

- Entre!

Baixou a maçaneta e penetrou no gabinete que já sabia acolhedor e agradável, se bem que espartano em objectos. Uma secretária larga de pau santo muito trabalhada encontrava-se de forma a apanhar a luz do dia pelas costas. Em cima um candeeiro que espraiava uma luz amarela e quente que saía de um abajour de esmalte. No lado contrário do móvel uma pequena central telefónica que Virgínia, a secretária de Bento Paixão, lidava com saber e agilidade. Ao redor a forrar as paredes apenas madeira e ao lado do que parecia ser uma porta uma cadeira seca também de pau santo.

- Bom dia Doutor Emídio Santana, sente-se que o doutor já o atende. Também ainda faltam dois minutos para a hora marcada.

Era sobejamente conhecido a tara de Bento Paixão pelos horários. Da mesma maneira que raramente se atrasava, não admitia que ninguém chegasse tarde aos seus compromissos.

À hora marcada a porta descerrou-se e Bento vendo Emídio sentado logo cumprimentou estendendo a mão:

- Bom dia jovem. Como estás? Entra…

O outro cumprimento o patrão e segui-o para dentro do gabinete respondendo:

- Bom dia Bento. Estamos bem obrigado!

Outro gabinete enorme, mas minimalista. Um portátil, um candeeiro, um copo com lápis e por fim o telefone, em cima de uma secretária com perto de dois metros de largura.

De lado dois sofás. Um maior onde caberiam duas pessoas e um outro pequeno onde se sentou Bento Paixão indicando à visita o maior.

- Bem vamos ao que interessa… - iniciou.

- Claro. Para já deixa-me dar-te os parabéns pelo teu novo cargo. Bem merecido!

Olhou para a visita e depois devolveu:

- Tu és pior que eu julgava… Safa!

Dirigiu-se à secretária e rapou de um dossier que entregou a Emídio!

- Tens aí o teu processo de ascensão na empresa. Como podes perceber subiste até Director de forma meteórica. Aproveitaste dos conhecimentos dos outros para essa escalada repentina. Depois, já no topo, cuspiste nos que te ajudaram…

O antagonista pareceu incomodado com estas primeiras palavras e tentou desculpar-se:

- Nunca despedi ninguém, nunca fiz nada para que as pessoas saíssem!

- Caramba… tu és mesmo velhaco. Foi com conversas destas que chegaste ao lugar que hoje ocupas. Nunca te sentiste culpado de nada… foste sempre inocente.

O tom de voz passou de suava a levemente crispado. Continuou:

- Imagino que veres-me aqui sentado a ser teu superior após uma série de anos a tentares mandar em mim, não te deve saber muito bem.

- Acho que foste bem escolhido… Sem qualquer dúvida!

- Emídio já deverias saber que a graxa comigo não pega. Sempre levaste a tua avante pela boa publicidade de fazias de ti próprio… Mas sabias de antemão que individualmente estavas anos-luz abaixo de muitos que contigo trabalharam.

Voltou para a sua secretária e desta vez sentou-se no enorme cadeirão de pele. Depois virou-se para a janela e perguntou:

- Emídio… achas que vale tudo na vida?

- Como assim?

- Deixares de ser um ser humano, para te tornares um vendido ao Diabo? Não tens vergonha? É esse o exemplo que dás aos teus filhos?

Sem deixar que o outro respondesse:

- Aproveitaste-te do trabalho dos outros, aprendeste com os mais velhos o pouco que sabes, mas logo que subiste correste com todos eles. És realmente um canalha!

- Tenho a consciência de que nada que fiz foi com desejo de magoar alguém… - respondeu Emídio sem denotar qualquer azedume.

Para continuar:

- Mas se consideras que sou uma menos valia para a empresa peço já a demissão, com efeitos imediatos.

Bento Paixão rodou na cadeira e olhando-o profundamente declarou:

- Preciso de ti onde estás… pois já sei como trabalhas… Outro que viesse teria de ser mais uma aprendizagem.

Emídio Santana levantou-se do seu cadeirão, dirigiu-se à porta, abriu-a e reparando que a sala da secretária estava vazia acabou por dizer:

- Vou escrever a minha carta de demissão. E antes do almoço já cá não estarei. Podes começar a procurar substituto para mim…

- Cá ficarei à espera da missiva. Dá cumprimentos à tua mulher e beijos aos miúdos.

O outro fechou a porta atrás de si, mas Bento Paixão o novo administrador da empresa onde Emídio Santana era Director, ainda hoje está a aguardar uma “certa” carta de demissão.

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