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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Hoje convido eu! #4

A desafiarem-me!

A troca de mensagens por correio electrónico com a Maria do Cantinho da casa originou na frase "Pai, isso pode ser demais..." e para a qual escrevi o texto seguinte.

Orlando era um homem bom! Amigo do seu amigo dedicava à palavra acordada um sentido muito especial: jamais voltava atrás!

Naquela noite após o jantar chamou o genro para o lado e disse quase em surdina:

- Preciso de si amanhã de manhã. Pode ser?

O genro adorava o sogro e logo respondeu afirmativamente. Como o velho Orlando não dera mais nenhuma resposta, Júlio avançou:

- Que se passa amanhã?

- Apareceu hoje aí um homem que me quer comprar o pinhal....

- O da quinta do Espinheiro?

- Esse mesmo! Mas eu só quero vender uma parte. Os de cima da encosta estão ainda muito delgados.

- A que horas vamos?

- Logo pela fresquinha.

- Conte comigo.

Na alvorada seguinte caía uma chuva fina de vez em quando sacudida por um vento feroz. Encontraram-se ambos na cozinha onde tomaram o pequeno almoço, calçaram depois os botins de borracha e partiram a pé.

No caminho foram falando de fazendas, de pedaços bons e outros nem por isso, de heranças.

- Herdei a pior parte de todas da enorme quinta... Mas hoje é a que vale mais.

Júlio fugiu de uma poça de água com um salto para logo regressar ao lado do sogro. Este manteve a conversa da fazenda.

- Quanto acha que vale a Quinta?

- Ui... não me faça essa pergunta...

- Porquê?

- Porque posso dar uma resposta que não gosta...

- Caneco, só por perguntar quanto vale uma fazenda? Mas diga lá a sua ideia...

- Para mim a quinta... bom como hei-de dizer...

- Eh pá desembuche...

- Bom, já que tanto insiste... a quinta... não vale nada!

Orlando parou subitamente no meio do caminho, fechou o chapéu de chuva e deu meia volta ficando virado para a aldeia. Depois rodou nos calcanhares olhou o jovem genro e enfiando o dedo na têmpora quase gritou:

- Você é maluco? Sabe o que está a dizer? - abriu o guarda-chuva e continuou o caminho sem dizer mais nada nem aguardar resposta.

Júlio aproximou-se do sogro e com a maior calma que conseguia demonstrar disse:

- Você não percebeu a minha resposta...

- Não percebi?

- Não! Eu não disse que a quinta não tinha valor, apenas assumi que agora e neste instante não vale nada... O que não quer dizer o mesmo.

- Ai não?

- Não. Mas vou explicar como deve ser e depois me dirá.

O outro continuava a andar agora num passo quase apressado tal era a raiva que sentia à resposta obtida.

- Todavia primeiro deixe-me fazer só mais uma pergunta... - e não esperando pela resposta continuou - você quer vender a Quinta neste momento?

- Você está parvo... Claro que não... 

- Ora muito bem. Assim as coisas só valem alguma coisa quando as queremos vender ou então comprar. Fora disso não valem nada! Pense nisso!

- Você não percebe nada disto! - devolveu o sogro.

Não voltaram a falar até à chegada ao portão da quinta. Já lá estava o prometente comprador que viera acompanhado pelo filho. O primeiro era um homem de muita idade, mas ainda assim dono de um passo ligeiro e de olhar vivo. Cumprimentaram-se os quatro homens e foram visitar o pinhal.

De volta ao portão começaram os mais velhos a discutir o preço enquanto os mais jovens se entretinham em conversas diferentes.

A negociação não parecia estar a correr pelo melhor já que se percebiam algumas negações, quando de súbito Orlando chama o genro e pergunta:

- Aqui o senhor Horácio oferece cinco mil contos pelo pinhal! Que me diz?

Júlio pouco entendido neste género de negócio respondeu:

- Parece um bom valor!

Já o filho do madeireiro ao ouvir o valor oferecido aproximou-se do pai e de olhos bem abertos, avisou:

Pai, isso pode ser demais...

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