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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Hoje convido eu! #28

A desafiarem-me!

Dona do blog Estou só a dizer coisas a Tri foi também convidada para me desafiar nesta aventura que já dura há quatro meses. Bom o curioso é que pela primeira vez foi apresentada uma ideia e assim sendo a palavra ou tema não aparece pespegado na prosa. Eis o que me foi lançado: Imagina que és um especialista em minas e armadilhas e tens que desmontar uma bomba-relógio dentro de 5 minutos.

Estão a imaginar não estão que este foi o exercício mais complicado! Ficou assim...

 

Sentiu o vibrar no bolso do seu telefone, mas não atendeu, para logo a seguir vibrar o do trabalho. E este não poderia nunca renunciar já que a sua profissão assim o obrigava.

Eram perto das onze e meia da noite e Justino andava mais a sua equipa de voluntários a distribuir alimentos e alguns agasalhos aos sem-abrigo que encontrava. Atendeu a chamada:

- Boa noite Ferreira que se passa?

- Viva, temos um caso super urgente para ti. Uma ameaça de bomba num centro comercial…

- A esta hora?

- Já enviámos uma equipa técnica para perceber se é verdade ou falso alarme, mas se for certo vamos necessitar de ti!

- OK! Já agora como souberam?

-Chamada anónima!

- Hummm. Reafirmo a minha dúvida: a esta hora?

- Imagino o que estarás a pensar...Mas fica atento!

Justino fez o trejeito com a cara em desacordo, mas respondeu:

- Estou sempre atento.

Meia hora depois recebeu nova chamada de um número que não conhecia:

- Fala Justino, quem fala?

- Boa noite, fala o agente Alcobia. Estamos no centro Comercial Casablanca e encontrámos um pacote estranho com um mostrador de um relógio em contagem decrescente e está envolto em fita de estanho, daquela que se usa nas condutas do ar condicionado.

- Quanto tempo falta?

- O relógio está a marcar 32 minutos…

- Ok. Dentro no máximo um quarto de hora estou aí!

Meteu-se no carro, tirou a sirene do banco de trás e arrancou a toda a velocidade. Porém apanhou uma estrada cortada durante a noite para obras e daí ter que dar uma volta muito maior do que seria devido.

Quando parou a viatura de forma brusca acorreu apressado à mala donde retirou o saco de ferramentas. Havia anos que se especializara em minas e armadilhas e se bem que tivesse pouco trabalho nesta área ainda assim aproveitava as férias para através dumas associações ir para África desmontar minas… Após anos de guerra civil!

Identificou-se e um agente jovem correu à sua frente abrindo o caminho. Chegado ao local já devidamente reservado Justino pediu:

- Saiam todos daqui, fazem favor. Gosto de estar sozinho e evacuem a zona pelo menos uns 100 metros em redor!

Um graduado chegou perto e devolveu:

- Já estamos a fazer isso. O pior é um lar aqui mesmo ao lado… Não sei se conseguiremos evacuar a tempo os idosos já que há muitos acamados.

- Correcto. Pronto… façam o melhor, mas por favor saia daqui!

Sentou-se defronte do pacote e ficou a olhar para ele com desdém! Depois espreitou-o ao seu redor e estranhou tudo aquilo…

O relógio continuava a contagem decrescente. Faltavam precisamente 5 minutos e assim de repente Justino não sabia que fazer! Tinha medo que ao movimentar tudo aquilo explodisse, depois não via qualquer fio ligado ao relógio digital.

Quatro minutos!

Uma porta de vidro separava-o dum corredor e alguém bateu nele. Ergueu-se e numa linguagem quase gestual percebeu que o lar estava já vazio.

- Pelo menos isso!

Abriu a caixa de ferramenta e retirou de lá um canivete que aplicou por debaixo de um pedaço de fita numa tentativa desesperada de chegar mais longe.

Três minutos e meio… O tempo fugia a uma velocidade impressionante. A fita foi saindo, mas houve um naco que ao sair abanou o pacote. Institivamente colocou as mãos por cima para que parasse.

Três minutos… A dúvida que tantas vezes o assaltara passava naquele instante a ser uma certeza. Não iria sair dali vivo. De súbito uma ideia. Pegou no telemóvel buscou um nome e ligou. Enquanto esperava que atendesse via os algarismos a descerem.

Dois minutos e meio! Finalmente:

- Espero que seja algo importante para me estares a ligar a esta hora…

- Cuca. Um pacote completamente envolvido em fita de estanho autocolante, um relógio digital em contagem decrescente… Dá-me uma dica ou vemo-nos no Inferno!

- Bolas Justino… Não há fios à mostra?

- Nada!

- Como está ligado o relógio ao detonador?

- Não sei, não consigo ver, nem sei se posso movimentá-lo…

- Isso NUNCA! Deixa-me pensar!

- Tens dois minutos!

Pior que as palavras trocadas foi o silêncio que se seguiu.

Justino encostou-se à parede de telemóvel em punho. Tinha minuto e meio para reviver toda a sua vida. Olhou para o tecto do edifício como se visse o céu exterior e deixou que uma lágrima fosse serpenteando pela barba de vários dias.

Um minuto…

- Justino… estás aí?

- Estou companheiro, estou!

- Não sei o que te dizer… - a voz era agora grave.

- Cuca vês porque precisávamos de um robô? Quantas vezes te disse?

- Nunca me coube decidir!

- Pois… não são eles que estão aqui!

Trinta segundos.

- A tua mulher e as tuas filhas como estão? – um pergunta para desanuviar.

- A dormir…

Contemplava a descida dos números no relógio enquanto crescia em si uma calma que não imaginava ser possível ter naquelas alturas.

Cá fora os agentes resguardam-se com temor do que pudesse acontecer. A madrugada estava fria e um vento soprava brando, mas suficiente para arrefecer a multidão. Mas naquele instante ninguém tinha frio. No interior um agente tentava a todo o custo desmantelar um eventual engenho explosivo… Pairava naquele espaço um profundo silêncio de morte!

Cinco, quatro, três, dois, um! Bummm!

A explosão ouviu-se na rua, mas nada do que imaginariam. Os polícias olharam uns para ou outros sem saberem bem o que fazer. Foi Ferreira, o chefe de Justino, que largando tudo correu para o interior do Centro Comercial.

Assim que entrou cheirou-lhe a pólvora e o ar estava fechado com uma nuvem branca quase “smog” londrino. Baixou-se e acercou-se do seu agente. Encontrou-o sentado e encostado à parede. A face estava desfigurada não de ferimentos, mas inundada de muitas cores e salpicada de confettis. A caixa havia mesmo rebentado. De lá saíra entre muitos papéis coloridos, saltara tinta e serpentinas. Mas o pior estava numa pequena bandeira branca com o símbolo do clube “Os Belenenses” do qual Justino era fervoroso adepto a um canto e no meio uma simples frase: “Parabéns!”.

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