Desafio de escrita dos pássaros #2.6
Mote: oh não, um vírus outra vez!
Havia algumas semanas que Elizário fora recolhido pelo casal, em que a jovem esposa tinha raízes na bela ilha açoriana das Flores.
Após uns dias de adaptação a uma vida que jamais conhecera, o veterano chegou-se junto do marido e num tom sereno perguntou:
- Senhor… até quando irei ficar aqui em casa?
O rapaz percebia que aquele homem estava demasiado habituado à rua, ao frio, à fome e acima de tudo à tristeza e más lembranças. Pensou calmamente na resposta de forma a não ofender o ilhéu. Por fim:
- O Elizário ficará aqui enquanto desejar… Não queremos, de todo, prendê-lo a nós. Gostamos de o ter cá, mas longe de nós forçá-lo…
As palavras saíram calmas, quentes. A jovem chegou entretanto e escutando as palavras do marido convidou:
- Quer ir até à nossa ilha?
O conterrâneo ergueu os olhos para a anfitriã e quase num soluço perguntou:
- Não está a falar a sério, pois não?
- Claro que estou… Todos os anos vamos lá pelas festas do São João. Se quiser pode vir com a gente…
As lágrimas voltaram a rolar. Eram pérolas de felicidade de um coração tantos anos amargurado.
- Eu não posso ir… - declarou.
- Porquê?
- Porque não tenho dinheiro… Nem cartão…
- Cartão?
- Sim aquele com a nossa cara…
- Ah o cartão de cidadão… Mas isso arranja-se, não se preocupe!
O florentino temia que tudo o que lhe estava a acontecer não passasse de um sonho. De um instante para o outro a sua vida virara para o direito após muitos anos do avesso. Por isso ao jantar enquanto comia um prato de sopa comunicou:
- Amanhã vou arranjar o vosso quintal. Já vi uma enxada e um ancinho… Depois digam o querem plantar.
Os jovens olharam entre si e sorriram. Por fim concordaram com o pedido de Elizário.
No dia seguinte Elizário não apareceu na cozinha onde costumava tomar o pequeno almoço. Admirados bateram à porta do quarto.
- Senhor Elizário, bom dia… Aconteceu alguma coisa?
De dentro escutaram:
- Oh… só estou com um bocadinho de febre…
- Febre? – perguntou a jovem num tom assustado.
Depois virou-se para o marido e exclamou:
- Oh não, um vírus outra vez!
Entretanto a porta abriu-se e de lá saiu Elizário a tremer e embrulhado num cobertor:
- Não tema menina… é só mais um ataque de paludismo.