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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Desafio de escrita dos pássaros #2.6

Mote: oh não, um vírus outra vez!

Havia algumas semanas que Elizário fora recolhido pelo casal, em que a jovem esposa tinha raízes na bela ilha açoriana das Flores.

Após uns dias de adaptação a uma vida que jamais conhecera, o veterano chegou-se junto do marido e num tom sereno perguntou:

- Senhor… até quando irei ficar aqui em casa?

O rapaz percebia que aquele homem estava demasiado habituado à rua, ao frio, à fome e acima de tudo à tristeza e más lembranças. Pensou calmamente na resposta de forma a não ofender o ilhéu. Por fim:

- O Elizário ficará aqui enquanto desejar… Não queremos, de todo, prendê-lo a nós. Gostamos de o ter cá, mas longe de nós forçá-lo…

As palavras saíram calmas, quentes. A jovem chegou entretanto e escutando as palavras do marido convidou:

- Quer ir até à nossa ilha?

O conterrâneo ergueu os olhos para a anfitriã e quase num soluço perguntou:

- Não está a falar a sério, pois não?

- Claro que estou… Todos os anos vamos lá pelas festas do São João. Se quiser pode vir com a gente…

As lágrimas voltaram a rolar. Eram pérolas de felicidade de um coração tantos anos amargurado.

- Eu não posso ir… - declarou.

- Porquê?

- Porque não tenho dinheiro… Nem cartão…

- Cartão?

- Sim aquele com a nossa cara…

- Ah o cartão de cidadão… Mas isso arranja-se, não se preocupe!

O florentino temia que tudo o que lhe estava a acontecer não passasse de um sonho. De um instante para o outro a sua vida virara para o direito após muitos anos do avesso. Por isso ao jantar enquanto comia um prato de sopa comunicou:

- Amanhã vou arranjar o vosso quintal. Já vi uma enxada e um ancinho… Depois digam o querem plantar.

Os jovens olharam entre si e sorriram. Por fim concordaram com o pedido de Elizário.

No dia seguinte Elizário não apareceu na cozinha onde costumava tomar o pequeno almoço. Admirados bateram à porta do quarto.

- Senhor Elizário, bom dia… Aconteceu alguma coisa?

De dentro escutaram:

- Oh… só estou com um bocadinho de febre…

- Febre? – perguntou a jovem num tom assustado.

Depois virou-se para o marido e exclamou:

- Oh não, um vírus outra vez!

Entretanto a porta abriu-se e de lá saiu Elizário a tremer e embrulhado num cobertor:

- Não tema menina… é só mais um ataque de paludismo.

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