Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Desafio de escrita dos pássaros #2.4

Mote: O google está errado.

Com ambas as mãos Elizário segurava a cabeça suja. Já se arrependera mais que uma dúzia de vezes em ter acompanhado aquele jovem, que tanto insistira com ele para o levar até sua casa.

Havia muito tempo que não entrava numa habitação asseada, onde os frescos cheiros domésticos não conseguiam sobrepor-se ao nauseabundo odor de alguém que vivia quase sempre na rua…

- Senhor Elizário quer tomar banho?

A questão fora formulada pela esposa.

- Não se acanhe… senhor. Tem ali dentro uma banheira grande, sabonete e uma roupa limpa. Gostaria que soubesse que também nasci nos Açores.

Elizário ergueu o pesado olhar para o rosto bonito da ilhéu e por fim perguntou:

- De que ilha, senhora?

- Sou da ilha mais bonita… das Flores.

Definitivamente o idoso não soube lidar com tamanha emoção. Já era difícil conhecer alguém açoriano e muito menos da mesma ilha. Subitamente as lágrimas caíram pela face rasgada por profundas rugas onde uma barba cinza nascia sem destino. As saudades a traírem-no.

A conterrânea percebendo a comoção pegou nas mãos sujas de Elizário, juntou-as e tapou-as com as suas. Finalmente com uma voz calma e doce observou:

- Vá tome um banho bom, arranje-se que depois falaremos sobre a nossa ilha. E demore o tempo que quiser… Não tenha pressa e se pretender rapar a sua barba tem lá espuma e lâmina.

Com alguma relutância Elizário aceitou a hospitalidade daquela família. Acabou por entrar na casa de banho alva e por lá ficou muito tempo.

Quando abriu a porta e apareceu ao casal, o ilhéu era sem dúvida um homem assaz diferente. A roupa, uns números acima do seu tamanho, assentava-lhe bem. A face lavrada por anos e desventuras, carregava uma luz estranha. Nas mãos os trapos que despira. A açoriana ergueu-se célere, pegou na roupa suja dizendo:

- Isto vai tudo para a máquina… – mentiu.

Sentaram-se então a uma mesa onde um portátil parecia ligado. O jovem mexia em qualquer coisa e Elizário só via coisas a aparecerem e desaparecerem. Por fim o anfitrião perguntou:

- De que sitio é das Flores?

- Da Fajã de Santo Elói.

Após alguns momentos voltou:

- Isso será ao pé de que terra?

- A Fajãzinha é perto…

Por fim confessou:

- Aqui no Google não aparece essa Fajã…

- Onde?

- No Google…

- O “gugle” está errado! – anunciou Elizário sem perceber o que dizia.

30 comentários

Comentar post