Desafio de escrita dos pássaros #2.4
Mote: O google está errado.
Com ambas as mãos Elizário segurava a cabeça suja. Já se arrependera mais que uma dúzia de vezes em ter acompanhado aquele jovem, que tanto insistira com ele para o levar até sua casa.
Havia muito tempo que não entrava numa habitação asseada, onde os frescos cheiros domésticos não conseguiam sobrepor-se ao nauseabundo odor de alguém que vivia quase sempre na rua…
- Senhor Elizário quer tomar banho?
A questão fora formulada pela esposa.
- Não se acanhe… senhor. Tem ali dentro uma banheira grande, sabonete e uma roupa limpa. Gostaria que soubesse que também nasci nos Açores.
Elizário ergueu o pesado olhar para o rosto bonito da ilhéu e por fim perguntou:
- De que ilha, senhora?
- Sou da ilha mais bonita… das Flores.
Definitivamente o idoso não soube lidar com tamanha emoção. Já era difícil conhecer alguém açoriano e muito menos da mesma ilha. Subitamente as lágrimas caíram pela face rasgada por profundas rugas onde uma barba cinza nascia sem destino. As saudades a traírem-no.
A conterrânea percebendo a comoção pegou nas mãos sujas de Elizário, juntou-as e tapou-as com as suas. Finalmente com uma voz calma e doce observou:
- Vá tome um banho bom, arranje-se que depois falaremos sobre a nossa ilha. E demore o tempo que quiser… Não tenha pressa e se pretender rapar a sua barba tem lá espuma e lâmina.
Com alguma relutância Elizário aceitou a hospitalidade daquela família. Acabou por entrar na casa de banho alva e por lá ficou muito tempo.
Quando abriu a porta e apareceu ao casal, o ilhéu era sem dúvida um homem assaz diferente. A roupa, uns números acima do seu tamanho, assentava-lhe bem. A face lavrada por anos e desventuras, carregava uma luz estranha. Nas mãos os trapos que despira. A açoriana ergueu-se célere, pegou na roupa suja dizendo:
- Isto vai tudo para a máquina… – mentiu.
Sentaram-se então a uma mesa onde um portátil parecia ligado. O jovem mexia em qualquer coisa e Elizário só via coisas a aparecerem e desaparecerem. Por fim o anfitrião perguntou:
- De que sitio é das Flores?
- Da Fajã de Santo Elói.
Após alguns momentos voltou:
- Isso será ao pé de que terra?
- A Fajãzinha é perto…
Por fim confessou:
- Aqui no Google não aparece essa Fajã…
- Onde?
- No Google…
- O “gugle” está errado! – anunciou Elizário sem perceber o que dizia.