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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Desafio de escrita dos pássaros #2.11

Mote: Actualizem-me, por favor!

Desde que regressara do hospital o açoriano passara a ser mais moderado nos esforços. Essencialmente nestes... No entanto continuava a cuidar do quintal com afinco e porque não dizê-lo com uma ternura própria de quem amou um chão fecundo
A menina da casa aumentava de volume conquanto avançava na gravidez. O marido cuidava dela com esmero, carinho e muito amor. E Elizário sorria em silêncio pois admirava o que via.
Por aqueles dias lembrava-se da mãe já falecida, também ela constantemente grávida, mas que não recebia um avo de carinho do pai. Era a irmã mais velha quem acabava sempre por ajudar a progenitora nos afazeres domésticos.
Outros tempos, pensava o veterano, enquanto lia um livro sentado numa cadeira no fundo do quintal, debaixo de uma frondosa laranjeira, onde as couves galegas, os tomateiros e as cebolas cresciam ordenadamente.
O velho soldado aprendera a ler na tropa, mas fora ali naquela família que o acolhera sem saber porquê, que desenvolvera o gosto pela verdadeira leitura. Primeiro uns livros quase infantis entregues pelo jovem benfeitor, para depois crescer o desejo de ler coisas diferentes.
Na casa havia muitos livros numa sala que servia de biblioteca. Elizário adorava sentar-se num velho cadeirão e olhar os volumes bem arrumados.
Um dia a conterrânea entrou na sala e reparando no velho soldado disse:
- Pode ler o quiser. Escolha, esteja completamente à-vontade!
Depois chegou-se a uma prateleira, retirou um livro, mirou-o e com um aceno de cabeça de concordância entregou-o a Elizário.
- Comece por este… “O Conde de Monte Cristo”. Uma história antiga, que creio irá gostar.
- Obrigado menina! – agradeceu com aquela humildade simples que sempre o caracterizara.
Depois remeteu-se ao silêncio enquanto folheava devagar o livro. Algumas poucas gravuras ilustravam a obra e ele ficou a olhá-las com genuína atenção.
De súbito o futuro pai entrou na sala e com um sorriso rasgado solicitou:
- Actualizem-me por favor…
Sem saber o que dizer Elizário olhou a amiga em busca de socorro para as palavras. Foi ela que acabou por desvendar o assunto:
- Querido, estava a dizer ao futuro avô que estes livros que aqui estão são para serem lidos.
O florentino adorava aquele epíteto de avô. Mas como poderia sê-lo se nunca fora pai? Entretanto a futura parturiente continuou:
- Já viste o que lhe entreguei para ler?
Mostrou a lombada do volume ricamente encadernado e disse ele:

- Perfeito!