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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Castanho Escuro

Nasceu debaixo de uma velha e rasgada albarda que cobriu em muitas e longas jornadas uma burra assaz teimosa. O palheiro do ti’Xico Favinha era um local propício e óptimo para se nascer. Debaixo das telhas de canudo, velhas como o mundo, os pombos, os pardais e sazonalmente as andorinhas nidificavam com serenidade.

Com ele nasceram cinco irmãos, todavia desde cedo mostrou-se mais ágil e afoito para fora do círculo maternal, que os demais. Fosse por isso ou por outra razão que ele desconhecia, a verdade é que rapidamente alcançou a liberdade de andar pelo barracão.

Quando atravessou pela primeira vez a velha e esburacada porta com acesso à rua cresceu nele uma emoção. Nesse dia conheceu o Sol luminoso, o céu azul, a terra batida e sentiu o cheiro intenso das lareiras acesas e demais outras estranhas fragâncias. Uma delas veio de um animal que não conhecia até àquele instante. Alto, muito alto tinha quatro membros como ele, mas deslocava-se somente em dois. Depois veio outro semelhante, mas mais pequeno. Depois mais outro...

Sentiu medo, muito medo e assim correu para o aconchego do seu buraco onde a mãe carinhosamente o lambeu. Quando lhe deu a fome procurou no chão alguns restos de um borracho que, descuidado caíra do ninho ou outro pássaro qualquer. Tudo servia para matar a fome.

Depois mais ou menos saciado deitou-se junto dos irmãos e dormiu serenamente.

Certo vez afoitou-se ainda mais na rua. Os odores bizarros cresciam, mas havia outros que sentia serem fantásticos. Ao longe pareceu escutar um barulho e reparou noutros animais grandes iguais aos da primeira vez e fugiu veloz para o barracão.

Todavia todos os dias voltava à rua e atrevia-se a ir cada vez mais longe. Fugia sempre que podia dos bichos grandes temendo que lhe fizessem mal.

Até que um dia um desses animais deu por ele e escutou:

- Papá, papá que cão tão giro. Já viste a cor dele? Castanho tão escuto que parece um chocolate.

Seria dele que falavam? Não percebia o que diziam, mas pareciam amistosos. Um deles, o mais pequeno, estendeu-lhe mesmo um osso. Hummmm! Como tinha bom aspecto e cheirava bem! Temeu o risco de se aproximar, mas provavelmente valeria a pena.

Lentamente aproximou-se do outro bicho, que nem sabia como ficara agora quase à sua altura. Perdeu o medo e num ápice ferrou o dente no enorme osso e escapou a toda a velocidade para o seu barracão, onde resguardado dos irmãos, ficou a ratar nele o resto do dia.

Na manhã seguinte voltou a encontrar o animal grande que após o ter visto escutou:

- Pai olha ali o Chocolate. Podemos levá-lo connosco, podemos?

Nem teve tempo para fugir para junto dos seus, pois no segundo seguinte estava num colo e numa viagem para muito longe do barracão do ti' Xico Favinha.

 

- Terá sido esta a tua história, velho companheiro? Se não foi, ficou a ser...

Chocolate, um cão rafeiro de cor castanha-escura ouviu a questão proposta pelo amigo, deu um breve latido como se tivesse percebido, bocejou e voltou a enterrar o focinho por entre as suas patas dianteiras e preparou-se finalmente para adormecer em cima do bonito tapete persa.

 

Texto escrito no âmbito do desafio da "caixa de lápis de cor" da  Fátima,. Entram também a Concha, A 3ª Face, a Maria Araújo, a Peixe Frito, a Isabel, a Luísa De Sousa, a Maria, a Ana D., a Célia, a Charneca Em Flor, a Miss Lollipop, a Ana Mestre, a Ana de Deus, a Cristina Aveiro, a bii yue, o João-Afonso Machado , a Marquesa de Marvila e a Olga Cardoso Pinto.

 

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