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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Starry Night de Vincent van Gogh

Resposta ao desafio da Fátima

 

Olhou o original e considerou que era um belíssimo quadro, mas estranho, difícil, quiçá um tanto duro.

No entanto a sua aposta seria igualá-lo, custasse o que custasse. Sabia de antemão que seriam necessários muitos dias e provavelmente imensas noites sem dormir para o terminar.

Alguém muito próximo e a quem contara a sua nova aventura, avisou-o:

- Isso é uma enormíssima loucura. Jamais o conseguirás acabar!

Porém Manuel era um homem abnegado, corajoso e tenaz. E tinha um lema na sua vida: o difícil está feito, o muito difícil é para logo, o impossível demora mais umas horas!

Na verdade, o tempo era algo que tinha de sobra e assim, abordando radicais desafios, fazia com que aquele fugisse num ápice.

Foram dias, noites, semanas numa luta constante. Fazia-o muito devagar como quisesse saborear cada momento, cada segundo. Depois os cuidados que tinha...

Enquanto ia desfiando lentamente o desenho, tentou ao mesmo tempo perceber que emoções terá o pintor holandês pretendido despoletar com um céu de estrelas envoltas num amarelo cintilante, a Lua luminosa, um povoado meio desaparecido e acima de tudo aquelas labaredas negras que cresciam para o céu. Ou seria um arbusto?

Certo, certo é que até um dos filhos, quando apareceu em casa e perante aquele salsifré só soube observar:

- Pai que ideia foi essa de escolher este quadro?

- Este ou outro, não interessa. O que realmente conta é fazê-lo, nada mais! - respondeu-lhe Manuel naquele seu ar bonacheirão.

Abanando a cabeça em desacordo o rapaz acabou por sair levando consigo a pergunta:

- Para quê aquilo? Não entendo!

Eram 4 horas e 5 minutos da madrugada de uma quinta feira quando Manuel finalmente colocou a última recorte no puzzle de 10.000 peças com o desenho do quadro "Starry Night" de Van Gogh.

 

No desafio Arte e Inspiração, participam Ana DAna de DeusAna Mestrebii yue, Célia, Charneca em Flor,  ConchaCristina AveiroGorduchitaImsilvaJoão-Afonso MachadoJorge OrvélioLuísa De SousaMariaMaria AraújoMarquesaMiaMartaOlgaPeixe FritoSam ao Luarsetepartidas

Um sopro de esperança – XXI

Resposta ao desafio da Ana

A visita ao lar onde estava a D. Amélia foi estranhamente rápida. A senhora idosa perdera toda a noção do local e das pessoas e até mesmo de coisas táo simples como uma colher. Não conheceu o filho e preferiu ver uns livros de crianças aos afectos do filho.

Assim Alcides saiu triste do lar e pensou em ligar a Ângela. Mas seria que ela agora o receberia?

Na verdade o engenheiro temia um encontro com a gestora. As memórias de uma juventude nem sempre são de fiar e a realidade actual poder-se-á ter alterado com o decorrer dos anos. Mas era tudo uma grande incógnita.

Decidido ligou para Ângela. Esperou pouco:

- Boa tarde Alcides! Então como está a tua mãe?

- Desculpa ligar-te agora mas a visita ao lar foi rápida já que a minha mãe está cada vez pior da senilidade. Nem me conhece…

- Lamento muito!

- Que me dizes a encontrarmo-nos ainda hoje? Acho que estou em falta para contigo!

Um silêncio sobreveio para finalmente sentir uma espécie de sopro no telefone. Parecia um mero sopro de alívio, mas poderia ser também um sopro de esperança.

Uma fruta mordida – XX

Resposta ao desafio da Ana

Ângela começou a desconfiar de que Alcides a evitava a todo o custo. Fosse por ter estado ligado à empresa onde agora trabalhava ou fosse por serem velhos conhecidos a verdade é que a gestora sentia que o seu coração necessitava de ver aquele homem de quem nunca se esquecera.

Retirou ao presente 15 anos para se colocar naquela aldeia onde conhecera um jovem tímido, com um sorriso enigmático, mas muito inteligente.

Porém na altura não o sabia já que tudo era alegria, festas e animação e  resto passava quase ao largo, a não ser umas trocas de ideias sobre livros lidos.

Esboçou um sorriso quando se lembrou daquela tarde em que ambos haviam desaparecido da companhia dos demais para apanharem umas peras esplêndidas, como diria Alcides. Porém a maioria dos frutos estava muito alta. Daí o jovem ágil e habituado àqueles desafios subiu ao cimo da pereira e apanhou apenas duas ou três peras que trouxe com cuidado para baixo.

Pegou numa passou-a pela manga do casaco de forma a limpá-la e finalmente ofereceu-a a Ângela. Lembrava-se tão bem dessa tarde. Deu uma dentada na pera e depois ofereceu-a a Alcides que recusou: Porém ela não desistiu e disse-lhe:

- Se deres uma dentada desse lado ficamos amigos para sempre.

Por fim ele mordeu a pera.

Uma tarde de Domingo – XIX

Resposta ao desafio da Ana

 

O primeiro fim de semana após ter assumido a chefia de um Departamento de investigação deveria ser de repouso. Porém Alcides tinha outros planos em mente e a maioria estava ligado à gestão de recursos humanos.

Até à entrada na empresa o jovem professor de uma Faculdade apenas se preocupava em dar as aulas de forma assertiva e competente e pouco se preocupava com a gestão humana. Parecia um sector com o qual tinha poucas ou nenhumas preocupações. Porém de um momento para o outro tudo mudara ainda por cimo após aquele conselho de Ângela-

A sua agulhe virou de repente e ficou a +ensara que estaria ela naquele momento a fazer? Pensou ligar-lhe mas isso poderia ainda mais estragar a sua relação já que após a entrevista jamais a vira.

O seu aparelho tremeu. Pegou nele e não conhecia o número. Atendeu:

- Estou quem fala?

Um breve silêncio e depois aquela voz:

- Olá… sou eu! Desculpa… deves tar mais que fazer…

- Não Ângela, não… Sinceramente estava a pensar em ti, mas antecipaste-te…

Novo silêncio para finalmente:

- Gostaria de me encontrar contigo… Amanhã à tarde… por exemplo Falarmos sobre Eça ou Camilo… ou outro autor mais recente.

Aguardou uma resposta:

- Agradeço mas amanhâ à tarde é impossúel  E dia da visita a um lar. Esta lá a minha mãe.

Uma pergunta intrigante – XVIII

Resposta ao desafio da Ana

Caía a noite sobre a cidade.

Ângela passara a tarde a ler estendida no sofá envolta numa manta quente. A chávena de chá fumegante estava já vazia após uma infusão de erva-príncipe. Lá fora uma água miúda batia na vidraça ajudada por vento algumas vezes forte.

Passara a manhã a responder a algumas entrevistas de emprego, mas ao invés de um normal desempregado era a ela que ligavam para recusar o emprego. Havia propostas para ser um pouco de tudo: Chefe de Recursos Humanos numa empresa de trabalho temporário, Administradora de consultora na área do retalho, directora de departamento de Auditoria de um banco.

Era óbvio que a sua fama de gestora de sucesso a precedera e daí os convites que caiam uns atrás dos outros.

 No entanto a sua cabeça saltitava entre o livro que tinha à sua frente e… Alcides naquele seu primeiro dia na empresa que ela dirigira nos últimos três anos com um sucesso evidente.

O curioso é que ainda não se tinham encontrado a sós desde aquela reunião atípica. Apenas troca de números de telefone que ainda nenhum usara. O seu coração começou a bater mais depressa e finalmente perguntou a si mesmo:

- Será Alcides o mesmo de há quinze anos?

Um gesto inspirador – XVII

Resposta ao desafio da Ana

Custou a Alcides abandonar os seus alunos, mas tendo em conta a proposta irrecusável, seria louco não aceitar o emprego de responsável pelo departamento de investigação com meios, tanto humanos com técnicos, ao seu inteiro dispor.

Quando entrou pela primeira vez na empresa, Ângela já se demitira tal como prometera, de forma a que não houvesse qualquer choque de interesses.

Porém antes, naquela manhã, Alcides retirou do seu roupeiro aquele fato, vestiu a camisa de punhos branca, colocou uma gravata e finalmente enfiou os botões de punho na camisa. Olhou-se ao espelho, respirou fundo, pegou na carteira e no telemóvel e partiu para o novo desafio.

Após as milhentas apresentações Alcides foi finalmente introduzido num amplo gabinete com vista para o Tejo.

- Será este o seu gabinete daqui por diante! – disse o administrador-delegado e responsável pelos Recursos Humanos.

- Obrigado… mas… não seria melhor ficar mais perto do laboratório?

- Claro e terá lá uma pequena sala de trabalho… Mas quando necessitar de fazer uma reunião este gabinete parece-nos adequado.

Aproximou-se da ampla secretária onde encontrou um envelope dirigido a si. Admirado pegou, mirou-o e percebeu que estava fechado. Finalmente abriu-o, retirou a folha de dentro e leu:

Viva Alcides,

espero e desejo que entres nesta empresa ciente que és uma forte aposta da administração para a evolução.

Estarei sempre a teu lado… sempre… mesmo que não me vejas.

Termino com um conselho: as pessoas nessa empresa são seres humanos!

Não te esqueças disso. Nunca.

Com amor,

Ângela

 Alcides só soube sorrir!

Um desafio empolgante – XVI

Resposta ao desafio da Ana

Com a contratação de Alcides, a jovem administradora cumpriu o que havia dito e demitiu-se da empresa. Mesmo oferecendo-lhe um lugar como consultora preferiu sair para não causar mal-estar.

Para já iria tirar uns dias de férias ainda que o tempo não fosse convidativo. Longe da cidade, do movimento louco, das permanentes correrias.

Naquela manhã levantou-se tarde de tal forma que a empregada quando entrou em casa assustou-se com a presença da patroa:

- Ai doutora… que não a sabia cá… Que susto! Desculpe… bom dia!

- Bom dia! Não te preocupes comigo. Vou arranjar-me e depois irei sair. Não sei quando chegarei.

- A doutora trabalha demais… e é uma jovem… tão bonita e solteira…

A patroa sorriu. Aproximou-se da empregada e confessou em tom baixo:

- Sabes que a vida prega-nos muitas partidas…

- Oh se prega doutora… - concordou a outra acenando com a cabeça.

- O que te vou dizer não é para contar a ninguém.

- Fique descansada… a minha boca é um túmulo – e cruzou os dedos sobre os lábios.

- Desempreguei-me… por amor!

- Ai doutora que história tão linda… - e rapou de um lenço que tinha na manga do casaco e limpou duas lágrimas.

- Agora é que vai ser um desafio… no mínimo empolgante! – devolveu Ângela.

Um medo forte – XV

Resposta ao desafio da Ana

Aprendera desde novo a viver com as adversidades que a vida lhe propunha. Como também percebera que teria de lutar mais que os outros para chegar mais acima.

Quando chegou ao seu pequeno apartamento numa zona suburbana ficou a pensar na precipitação de acontecimentos desse dia. Uma amálgama de sensações, emoções, memórias e no fim um receio terrível!

Sabia que o seu coração, havia muito, que tinha dona. Mas assumi-lo não era coisa que ele dissesse a alguém. Depois esperava encontrar alguém que a fizesse olvidar. Bem que tentou, mas nenhuma delas era… Ângela. Para naquele dia a ver ali bem perto de si, com aquela beleza que sempre a caracterizara.

- Caneco o mundo é tão pequeno… - disse para consigo já sentado no seu sofá.

O problema maior surgia agora, pois teria de escolher entre ser professor numa faculdade ou quase investigador sénior numa empresa de renome… com as naturais boas alternativas financeiras. A responsabilidade seria muito grande e daí sentir um medo tão forte que quase lhe tolhia a fala.

Depois deitou-se no sofá cruzou as mãos por detrás da cabeça e ficou a mirar o tecto branco e a recordar aqueles dois beijos que tivera a coragem de pespegar em Ângela!

Acabou por adormecer e tal como na bonita canção de Carlos Paião sonhou com ela!

“A ONDA” de Katsushika Hokusai

Resposta ao desafio da Fátima

Havia tempos que andava com anseio de ir a um antiquário. Acima de tudo porque necessitava de comprar uma estante e as modernas durariam menos que nada.

Entrou na loja repleta de tanta coisa velha e antiga. Pairava no ar um aroma onde se misturava a cera, cânfora e bafio. 

Por detrás de uma velha secretária ergueu-se o vendedor que, não obstante as evidentes cãs, parecia mais novo do que aparentava.

- Boa tarde…

- Boa tarde – respondeu o cliente – posso dar uma volta?

Conhecia bem a forma de comprar algo mais barato neste tipo de lojas.

- Com certeza… Esteja à-vontade… Procura alguma coisa especial?

- Não, nem por isso – mentiu – mas gosto de ver este tipo de lojas.

- Então... sinta-se em casa.

Foi tricotando por entre muitos móveis loiças, faianças, relógios ou rádios velhos. O dono seguia-o à distância não fosse alguém mais… estranho e quiçá amigo do alheio. A determinada altura o eventual cliente perguntou:

- Diga-me este lustre é de vidro banal ou cristal?

- Vidro antigo… Tem mais de 150 anos!

- Qual o preço?

Aproximando-se retirou de um godé do lustre um pequeno papel onde marcava trezentos euros. Mostrou-o, mas acrescentou:

- Para me estrear hoje vendo por 250 euros…

O cliente nada disse e continuou a procurar o tal móvel que não confessara. Viu discos de vinil e bobines de fita magnética para gravadores, estatuetas, cachimbos, cómodas do tipo D. José, cadeiras em pau-santo, umas caixas de charão, uma grafonola e um gramofone de campânula de madeira que assumiu ser bem antigo, diversos vidros em casca de cebola e uns pratos da antiga Fábrica Ratinho. Por cima de alguns móveis pode perceber umas travessas Miragaia e noutro uma terrina que lhe pareceu razoavelmente antiga, quiçá da Real Fábrica de Sacavém. Nalgumas vitrines conseguiu também descobrir diversas garrafas licoreiras, algumas completas, outras sem tampa e outras ainda com os cálices em anexo.

Pelas paredes, para além de uns espelhos velhos, alguns relógios ingleses e diversos quadros. No chão havia outros. Meteu as mãos e foi folheando as diversas molduras encostadas umas às outras e em cada uma das gravuras espreitava. Até que percebeu algo diferente. Puxou o quadro para fora.

Endireitou-o com ambas as mãos e ficou a mirá-lo. Poisou-o em cima de uma trinchante e afastou-se para ter uma melhor perspectiva.

O lojista aproximou-se e perguntou:

- Gosta?

- Gosto… sabe o que é?

O outro fez uma espécie de careta e devolveu:

- Quem não conhece...?

- A “Onda” não é uma peça fácil de encontrar.

Percebeu que tinha falado demais já que o homem iria provavelmente aproveitar-se do comentário para acrescentar alguns euros ao preço. Deixou o quadro e prosseguiu pela loja. Finalmente viu ao longe a estante que lhe serviria. Aproximou-se, mas em vez de se mostrar interessado no móvel voltou as suas baterias para uma secretária ao lado.

- Sabe o tamanho desta?

Num passe de magia surgiu uma fita métrica nas mãos do vendedor e num ápice estendeu a fita e respondeu:

- Tem um metro e vinte… - virou a fita… - por oitenta!

- E quanto quer por ela?

- Setecentos euros… Mas olhe que isto é de pau-santo…

- Já vi que sim.

- E esta estante?

- Essa é barata… Duzentos euros… - respondeu de cor.

Era um preço interessante, mas aquela gravura de Katsushika Hokusai ficara-lhe no goto!

- Bem se calhar em vez da secretária levo a estante…

- Fica bem servido… é um bom móvel. Quer que lho entregue em casa? - perguntou o lojista contrariado por não vender a secretária.

- Mas ainda não acordámos no preço…

- Olhe que duzentos euros é barato…

O cliente virou as costas como se desinteressasse e dirigiu-se para a saída. De súbito o vendedor propôs:

- Duzentos euros pelo móvel e leva a “Onda”…

A alma do cliente quase saltava de alegria, todavia nada demonstrou e com a calma de quem está habituado a fazer negócios estendeu a mão dizendo:

- Negócio fechado!

 

No desafio Arte e Inspiração, participam Ana DAna de DeusAna Mestrebii yue, Célia, Charneca em Flor,  ConchaCristina AveiroGorduchitaImsilvaJoão-Afonso MachadoJorge OrvélioLuísa De SousaMariaMaria AraújoMarquesaMiaMartaOlgaPeixe FritoSam ao Luarsetepartidas

Uma previsão do futuro – XIV

Resposta ao desafio da Ana

Após a reunião assaz estranha e inimaginável onde gratas recordações vieram a lume no seu espírito, Ângela regressou ao seu gabinete e aguardou por alguns dos seus colegas da equipa de gestão.

Um a um foram chegando e sentaram-se à frente da secretária da responsável máxima aguardando o que Ângela teria a dizer. Após um breve silêncio a Administradora iniciou a reunião:

- Bem… como calculam a reunião com o… Al… o engenheiro Alcides Correia foi, no mínimo, estranha. Jamais pensei ver este senhor com quem convivi há muitos anos. Na altura perdi-lhe o rasto…

Levantou-se do seu lugar, virou-se para a paisagem urbana e continuou:

- Não sei o que decidirá o engenheiro, mas uma coisa assumo já aqui e agora… se ele vier para a empresa eu peço imediatamente a demissão. Não quero que haja choques de interesses.

Um burburinho fez-se ouvir e um dos colegas acabou por perguntar:

- Ângela… e qual será o nosso futuro sem a sua presença?

Ela esboçou um sorriso, rodou 180 graus, e enfrentou o outro sem mágoa nem rancor:

- A minha previsão é que o futuro será sempre risonho. Cada um de vós sabe muito bem o que faz e com a chegada do engenheiro a nossa maior falha fica colmatada.

- E a Ângela? Que vai ser de si?

- Eu? Vou finalmente viver o amor da minha vida!