O encontro entre ambos foi algo quase bizarro. Para ambos!
Tantos anos em busca da outra metade e de um momento para o outro a vida, a divida providência ou o mero acaso colocara-os no mesmo trilho.
Ângela chegou cedo ao jardim onde haviam combinado se encontrar. Sentou-se num banco e pegou no livro que trazia e reiniciou a leitura.
Uma leve brisa soprava no cimo dos choupos e dos amieiros. A tarde principiava a cair quendo no instante seguinte alguém se sentou a seu lado com um ramo de flores. Assustada pelo repentismo de Alcides, deu um safanão no jovem engenheiro dizendo:
- Parvo… assustaste-me. Isso não é ser cavalheiro…
- Desculpe minha senhora, mas pensei que fosse mais rija de emoções – devolveu Alcides a sorrir.
- Parvo, idiota…
- A senhora está-me a ofender! E mais, esta parece-me uma discussão deveras idiota. Ainda por cima logo no dealbar do nosso primeiro encontro - continuou o outro a rir com gosto.
Ângela acabou por sorrir e aceitou o belo ramo de orquídeas que ele lhe oferecia!
Olhou o original e considerou que era um belíssimo quadro, mas estranho, difícil, quiçá um tanto duro.
No entanto a sua aposta seria igualá-lo, custasse o que custasse. Sabia de antemão que seriam necessários muitos dias e provavelmente imensas noites sem dormir para o terminar.
Alguém muito próximo e a quem contara a sua nova aventura, avisou-o:
- Isso é uma enormíssima loucura. Jamais o conseguirás acabar!
Porém Manuel era um homem abnegado, corajoso e tenaz. E tinha um lema na sua vida: o difícil está feito, o muito difícil é para logo, o impossível demora mais umas horas!
Na verdade, o tempo era algo que tinha de sobra e assim, abordando radicais desafios, fazia com que aquele fugisse num ápice.
Foram dias, noites, semanas numa luta constante. Fazia-o muito devagar como quisesse saborear cada momento, cada segundo. Depois os cuidados que tinha...
Enquanto ia desfiando lentamente o desenho, tentou ao mesmo tempo perceber que emoções terá o pintor holandês pretendido despoletar com um céu de estrelas envoltas num amarelo cintilante, a Lua luminosa, um povoado meio desaparecido e acima de tudo aquelas labaredas negras que cresciam para o céu. Ou seria um arbusto?
Certo, certo é que até um dos filhos, quando apareceu em casa e perante aquele salsifré só soube observar:
- Pai que ideia foi essa de escolher este quadro?
- Este ou outro, não interessa. O que realmente conta é fazê-lo, nada mais! - respondeu-lhe Manuel naquele seu ar bonacheirão.
Abanando a cabeça em desacordo o rapaz acabou por sair levando consigo a pergunta:
- Para quê aquilo? Não entendo!
Eram 4 horas e 5 minutos da madrugada de uma quinta feira quando Manuel finalmente colocou a última recorte no puzzle de 10.000 peças com o desenho do quadro "Starry Night" de Van Gogh.