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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

O Pastor #12

Passaram-se Invernos e Verões sem que ninguém percebesse. O jovem pastor continuava o seu vai-vém com o seu rebanho. O pai moderara-se e havia algum tempo que mantinha o emprego. A vida parecia correr bem… Somente as estórias no largo haviam desaparecido totalmente, para enorme tristeza de alguns que sempre que apanhavam o pastor faziam sentir isso. Mas ele não se atemorizava e respondia a preceito.

Entretanto o canito Sapatos também envelhecera e já raramente seguia com o dono. Por isso surgiu o Poeta devido à forma como conseguia mais aquele osso com carne. Com  a frase: este cão parece um poeta a mendigar carne, é que nasceu o seu nome.

Não obstante estar ainda a aprender o serviço, já se desenrascava a preceito e conseguia com qualidade colocar o gado no caminho certo. Perdia-se por vezes atrás de algum coelho o que irritava o pastor:

- Poeta por onde andaste? Que coisa essa de andares sempre atrás dos bichos…

Havia muito tempo que a menina da Quinta das Figueiras não aparecia ao jovem pastor. A última frase deste deixara-a de coração destroçado, mas ao invés de desistir apercebeu-se que teria de conquistar o coração do pastor de forma mais subtil. Para tal necessitava de saber os seus gostos e desejos.

Sem que ele percebesse esperou-o dias a fio na encruzilhada. Mas vendo-o um dia ao longe escondeu-se dele. Trazia sempre consigo um bom naco de carne que originava que Poeta desaparecesse durante algum tempo.

Percebeu assim a ligação do pastor com o gado, a terra, as plantas… Aquilo era uma mistura perfeita entre homem e natureza. Mas um dia a jovem percebeu que o pastor … escrevia.

Não sabia o quê, mas o rapaz estava longos minutos a rabiscar qualquer coisa numa espécie de sebenta velha. Seriam as estórias que inventava ou apenas coisas diferentes? Seria por ali que teria de pegar o seu homem. Agora necessitava de saber como…

Dias mais tarde quando estava de regresso, o pastor encontrou um livro no chão. Parou a mirá-lo e olhando em seu redor baixou-se para lhe pegar. Leu o título: “O Conde de Monte Cristo”. Nunca ouvira falar da obra, mas pareceu-lhe enorme com a letra bem miúda. Sem dar por isso sentou-se numa pedra e começou a ler. E a cada página seguia-se outra e mais outra. Devorou páginas sem saber enquanto o gado se afastava de si. Quando de repente ouviu o cão ladrar é que percebeu o que acontecera: o gado fugira para o lado da Quinta das Figueiras. Correu a tentar reencaminhá-las, mas algumas já haviam entrado no prado verde e suculento. E o Poeta não conseguira controlá-las a todas.

Esgueirando-se conseguiu finalmente juntar as ovelhas e regressou ao caminho.

Porém perdera o livro.