Prova de amor!
Com os pés descalços enfiados no manso caudal do ribeiro, ela perguntou-lhe:
- Amas-me?
Ele gostava dela, mas amá-la? Sabia lá o que isso queria dizer… Todavia:
- Claro que sim… Duvidas? – arriscou.
- Eu não duvido que te ame – respondeu ela agitando os pés alvos na água, originando que a areia do fundo saísse do seu permanente repouso.
- Então?
- Duvido é que saibas o que é o amor…
Seria que ela lia a sua mente? Ou ele falara em tom alto? A verdade…
- Porque dizes isso?
- Oh… conheço-te… E sei o que passaste quando eras miúdo… com os teus pais.
- Isso não quer dizer nada – desculpou-se.
Tirou os pés da água fria, limpou-os à borda do vestido, calçou os sapatos e dando a mão ao namorado, acrescentou:
- Quero uma prova de que me amas…
- Como assim? – assustou-se
- Se me amas fazes tudo por mim, certo?
- Sim… sim…
Ela não gostou da gaguez dele, parou e enfrentou-o:
- Ficaste gago de repente?
- Não… Mas eu também te conheço e nem imagino o que me vais pedir para fazer…
- Fácil, vai ser muito fácil…
Ele temia… temia que ela o colocasse numa posição pouco confortável. Mas seguiu-a normalmente.
A tarde trazia uma aragem cálida com cheiro a milho acabado de ceifar. Um ou outro cirro escondia a espaços o sol quente. Chegados à aldeia encaminharam-se para casa dela.
- Vamos a tua casa?
- Vamos…
O pai dela não era o cúmulo da simpatia não obstante saber e autorizar o namoro. No entanto era conhecido pela sua teimosia e raramente perdia uma demanda.
- Agora que estamos a chegar quero que convenças o meu pai a termos um cão.
- Como…
- É o que te disse… convence o meu pai a eu poder ter um cão e fico convencida que me amas.
A proeza parecia bem maior que a princípio parecia, já que o jovem conhecia sobremaneira o espírito do pai da namorada. Um primeiro suspiro seguido de um sopro denunciou-o.
- Já sopras?
- Deixa-me com os meus botões. E o que tenho de dizer?
- Diz o que quiseres. Só quero que ele diga sim. Compra-o… faz o que entenderes.
Ela esboçou um sorriso malicioso.
Já em casa após os cumprimentos sempre frios dos antecessores da jovem, o rapaz pegou no braço do eventual futuro sogro e pediu:
- Caríssimo, necessito falar consigo algo muito importante…
- Não me vai pedir dinheiro emprestado, pois não?
- Obviamente que não. Mas se fosse esse seria o menor dos seus problemas.
O outro olhou-o e ficou intrigado! Por fim:
- A sua filha quer que eu lhe dê uma prova de que a amo.
- E não ama?
- Oiça… posso continuar?
Perante o silêncio, prosseguiu:
- Então a prova passa por eu o convencer a autorizá-la a ter um cão…
- Nem pensar! Ela que desista da ideia… - gritou furioso.
- Calma, calma. Estou de acordo consigo… Mas eu tenho de superar esta prova. E o senhor vai-me ajudar…
- Já disse que não quero cá cão nenhum. Fim de conversa!
- Mas deixe-me explicar. O amigo ainda não percebeu que eu também não quero um animal na minha vida? Ela é que quer…
O mais velho ficou pensativo…
- É fácil… Chegamos ali os dois e comunicamos que o amigo autoriza um cão cá em casa…
- Mas…
- Calma homem, calma – interrompeu o jovem – Ela vai cair aos seus braços toda contente, mas é aí que você mata a jogada.
- Não percebo…
- O meu caro vai dizer que autoriza desde que o animal fique sempre em sua casa, mesmo quando ela se casar e sair do lar.
- Mas eu não quero isso.
- Pois não, eu sei… Mas se colocar essa condição ela irá recusar. Mas você autorizou o cão que nunca virá e eu ganho a confiança dela.
O pai olhou-o de soslaio e tentou rebobinar a história.
- Então eu chego ali e digo que você me convenceu a que a minha filha traga um cão cá para casa desde que ele nunca mais saia de cá. É isso?
- Perfeito!
- E se ela aceita?
- Creia-me que ela não aceita esta condição.
- Você está muito confiante.
- Estou.
- Convenceu-me… Então vamos lá…
Entraram ambos na sala em amena cavaqueira e a jovem tentou ler nos olhos do namorado a resposta. Mas não conseguiu. Por fim o pai principiou a falar.
- Aqui o teu rapaz sabe-a toda…
- Então paizinho…
- Convenceu-me a que tragas para cá um cão. Algo que nunca autorizei.
A jovem deu um grito de alegria e correu para o pai a abaraçá-lo.
- Ai… obrigada… a ambos!
- Porém há uma condição que imponho…
- Oh bem me parecia que fora fácil demais…
- O animal ficará sempre em nossa casa mesmo que um dia saias de cá!
A jovem ficou petrificada. Tal como namorado previu aquela não era a vontade dela. Olhou para o jovem e depois para o pai e finalmente a mãe. Rodou nos calcanhares para não mostrar uma lágrima que fazia caminho pela face lisa e bonita. Os homens entretanto esboçaram um breve sorriso de vitória e o pai piscou mesmo o olho ao futuro genro.
De repente a filha devolveu:
- Está bem… de acordo. Assim quando for para a minha casa arranjo outro cão!