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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

21 dias na aldeia (6)

V - A aldeia

 

É tarde! O sol passou a linha do meio-dia.

A aldeia descança, digere o elimento.

Ah! Mas daqui a pouco, daqui a um só momento,

A aldeia acordará e acabará o dia

a trabalhar. Os homens, no campo, a fornear,

P'ra que o mato bravio não seque a oliveira,

Não lhe vá fazer mal, n~ºao a possa matar!

Elas ficam em casa, lá na lide caseira.

 

O camponês descansa e senta-se um pedaço

Naquele pedregulho ao pé da oliveira.

Quem dera fôsse noita e sentado àlareira,

A ver ferver a sôpa numa panela de aço.

Mas não! Não poderá voltar ao casario

Da aldeia onde vive, onde vê o seu lar.

Enquanto o seu trabalho ele não acabar,

Enquanto não queimar todo o mato bravio.

 

Ânimo camponês! Pega na tua enxada,

E destrói essa erva, essa amaldiçoada.

Trabalha camponês! Vê que o azeite é ouro,

E a erva matará todo esse teu tesouro!

 

E o cavador trabalha, sempre, até ao sol posto.

Vamos camponês! Em casa, a tua espôsa,

Olha que ela trabalha, olha que ela não gosa!

Ela também transpira o suor do seu rosto.

 

E a enxada sobe, a enxada desce!

O homem sua, a fôrça cresce!

Mas é preciso mais, muita força ainda!

É preciso uma enorme e bruta fôrça infinda.

 

A carripana avança, puxada pelos dois

Enormes e possantes animais de tracção.

Pelos carreiros estreitos, fora da povoação,

Lá vou, - chiando os eixos, - esse carro de bois.

E o condutor munido do aguilhão arisco,

Vai cantando, baixinhoe e num tom magoado.

E diz, para animar o gado tão carregado:

"Anda lá Galhardo! Para a frente Mourisco!"

 

E os bois mansos lá seguem pelo carreiro adeante.

- Carreiro estreito e mau onde falta o betume,

Onde as pedras são soltas, onde o carro passante

Parece ir a tombar com os balanços que dá,

Onde os cascos dos bois fazem raios de lume!

Mas o boieiro é firme, atento e vigilante!

 

Vede a mulher além, nessa casa branquinha,

Agora lava a loiça ou arranja o jantar,

Para que o marido, no fim de trabalhar.

Possa em paz descançar, dizer em voz baixinha:

"Obrigado mulher! Tu és a minha vida,

Tu és a espôsa santa, tu és a espôsa querida!"

 

E enquanto a mãe trabalha no arranjo do lar,

Enquanto o pai trabalha no campo, entre o pó,

O bébé descansando, no berço, a dormitar,

Face côrada e linda vai fazendo o ó-ó.

 

E a mãe coitada, e sem deixar de trabalhar

Canta baixinho. A voz serve para embalar.

E um raio de sol entrando pela janela

Do quarto do menino bonito e rosado

Não resiste e ao ver a sua face bela,

Vem mui devagarinho deitar-se a seu lado.

 

"Mas vem raio de sol, lento e devagar!

Cuidado não vás tu o bébé acordar!"

 

As paredes branquinhas, de brance e alva cal

Reflectem, como espelhos, o quente sol de verão,

A dar luz e calor à linda povoação,

A tornar mais bonita esta tarde estival.