21 dias na aldeia (6)
V - A aldeia
É tarde! O sol passou a linha do meio-dia.
A aldeia descança, digere o elimento.
Ah! Mas daqui a pouco, daqui a um só momento,
A aldeia acordará e acabará o dia
a trabalhar. Os homens, no campo, a fornear,
P'ra que o mato bravio não seque a oliveira,
Não lhe vá fazer mal, n~ºao a possa matar!
Elas ficam em casa, lá na lide caseira.
O camponês descansa e senta-se um pedaço
Naquele pedregulho ao pé da oliveira.
Quem dera fôsse noita e sentado àlareira,
A ver ferver a sôpa numa panela de aço.
Mas não! Não poderá voltar ao casario
Da aldeia onde vive, onde vê o seu lar.
Enquanto o seu trabalho ele não acabar,
Enquanto não queimar todo o mato bravio.
Ânimo camponês! Pega na tua enxada,
E destrói essa erva, essa amaldiçoada.
Trabalha camponês! Vê que o azeite é ouro,
E a erva matará todo esse teu tesouro!
E o cavador trabalha, sempre, até ao sol posto.
Vamos camponês! Em casa, a tua espôsa,
Olha que ela trabalha, olha que ela não gosa!
Ela também transpira o suor do seu rosto.
E a enxada sobe, a enxada desce!
O homem sua, a fôrça cresce!
Mas é preciso mais, muita força ainda!
É preciso uma enorme e bruta fôrça infinda.
A carripana avança, puxada pelos dois
Enormes e possantes animais de tracção.
Pelos carreiros estreitos, fora da povoação,
Lá vou, - chiando os eixos, - esse carro de bois.
E o condutor munido do aguilhão arisco,
Vai cantando, baixinhoe e num tom magoado.
E diz, para animar o gado tão carregado:
"Anda lá Galhardo! Para a frente Mourisco!"
E os bois mansos lá seguem pelo carreiro adeante.
- Carreiro estreito e mau onde falta o betume,
Onde as pedras são soltas, onde o carro passante
Parece ir a tombar com os balanços que dá,
Onde os cascos dos bois fazem raios de lume!
Mas o boieiro é firme, atento e vigilante!
Vede a mulher além, nessa casa branquinha,
Agora lava a loiça ou arranja o jantar,
Para que o marido, no fim de trabalhar.
Possa em paz descançar, dizer em voz baixinha:
"Obrigado mulher! Tu és a minha vida,
Tu és a espôsa santa, tu és a espôsa querida!"
E enquanto a mãe trabalha no arranjo do lar,
Enquanto o pai trabalha no campo, entre o pó,
O bébé descansando, no berço, a dormitar,
Face côrada e linda vai fazendo o ó-ó.
E a mãe coitada, e sem deixar de trabalhar
Canta baixinho. A voz serve para embalar.
E um raio de sol entrando pela janela
Do quarto do menino bonito e rosado
Não resiste e ao ver a sua face bela,
Vem mui devagarinho deitar-se a seu lado.
"Mas vem raio de sol, lento e devagar!
Cuidado não vás tu o bébé acordar!"
As paredes branquinhas, de brance e alva cal
Reflectem, como espelhos, o quente sol de verão,
A dar luz e calor à linda povoação,
A tornar mais bonita esta tarde estival.