És um poeta! Anunciou vaidoso
Porém numa chispa de lucidez
Devolvi em natural pensamento
Se seria a modéstia, talvez
Que via na graça um tormento.
Ninguém diz ao ferreiro que o é,
Ele sabe por detrás da bigorna.
Ninguém clama pelo cavador José,
Que fende a preceito a terra madorna.
Poeta não é rasgar as palavras...
É senti-las. Tactear o veludo da vida
Da epiderme das almas ilécebras,
E amar sem destino a dor perdida.
Poeta é chamar a nós a ternura,
Sonhar e crer que tudo é real.
Desfazer-se em torrentes de amargura,
Sofrer como se tudo fosse igual.
És um poeta, repetiu garboso.
Eu então sorri...
E respondi:
És um mentiroso
No silêncio secreto da noite
o amor tem mais calor, renasce.
Nos passos denunciados dos amantes
o medo tem mais força, treme,
No desabrochar das flores
o aroma tem mais encanto, perde-se.
Finalmente quando se acorda,
o sonho prende-nos a esperança, vivemos.
Quando te procuro,
perco-te.
Quando te desejo,
envolvo-te.
Quando te amo,
descubro-me.
Quantas palavras escrevi sem sentido?
Que sonhos tive eu que se perderam?
As lágrimas salgadas de um vendido
São chamas lúgubres que se apagaram
Apetece-me roubar esta face ao mundo
Para que possa alimentá-la sozinho
Queria sim sentir toda a alma a fundo
A raiva, o desespero de um fim maninho
Hoje os meus passos são já diferentes
Daqueles que caminhei em tempos
São doentios, cobardes e abafados.
Dia após dia os meus gestos quentes,
Tornam-se tristes. Agora nos campos
Nascem árvores, flores ou cardos.