Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

Poema de resistência e amor

Este poema foi escrito em homenagem a um bom amigo vítima de Esclerose Múltipla, doença da qual viria a morrer. Trabalhámos juntos muitos anos e durante todo esse tempo sempre mostrou uma coragem e uma tenacidade de fazer inveja. Hoje recordei-o e a este breve poema.

 

Por vales de seda e linho,

Desafias um longo caminho…

De dor, de dor.

 

Um trilho ímpio, sinuoso,

Amargo, tenebroso…

E triste e triste.

 

Entre loas de imenso fervor

Há uma história de amor…

E paz e paz.

 

Renasce das tuas entranhas,

Uma aragem todas as manhãs,

De viver, de viver.

 

És a força, o mar e a terra,

Que em ti frágil, encerra…

A glória, a glória.

 

Os teus sonhos brilhantes,

São ósculos de amantes,

Sorrindo, sorrindo.

 

Resistes como um ancião vadio,

À morte num desértico baldio…

Tenaz, tenaz.

 

Coragem é quem vive assim,

Simplesmente tão perto do fim,

E ama e ama.

Hoje convido eu! #15

A desafiarem-me!

Quem é que neste sapal não conhece a Mula do blogue Desabafos da Mula? Creio que ninguém. Esta menina foi das primeiras com quem tive interacção e por isso também era minha obrigação convidá-la para este desafio. Respondeu com uma pequena palavra: luz.

Mais um tema mui complicado que deu no texto infra.

 

Saiu do hospital tão desesperado como entrara. No coração a chaga que já existia sangrava agora profundamente.

Meteu-se no carro e conduziu-se para casa, alheado a quase tudo. Morava numa aldeia pequena na zona saloia e foi para lá que se dirigiu. Passou por diversas povoações até que estranhamente lhe deu a fome. Assim que pode parou o carrou e procurou um sítio para comer. A tarde aproximava-se do fim, mas o calor do dia ainda se fazia sentir.

Encontrou um café e ali enganou o estômago. Pagou e ao atravessar a rua para ir para o carro deu com uma pequena igreja branca. Sem saber como desviou-se para lá e encontrando a porta escancarada, entrou.

Era uma daquelas oradas de vilarejos, pouco decoradas, simples, mas acolhedoras. O altar ao fundo apresentava quatro imagens. Conheceu Santo António e Nossa Senhora, mas as outras imagens desconhecia.

Sentou-se no banco corrido mais próximo da saída e ali ficou sem saber bem o que estava a fazer. Baixou a cabeça e tapou-a com ambas as mãos. Para no instante seguinte escutar:

- Boa tarde posso ajudá-lo nesse desespero?

Paulo ergueu-se e deu de caras com um padre que teria aproximadamente a sua idade. Não vestia batina, mas usava o conhecido cabeção alvo. Fez menção de sair.

- Desculpe… não deveria estar aqui…

- Não lhe pedi para sair… Apenas se poderia ajudá-lo… - e colocando uma mão sobre o ombro do outro, acrescentou – Sente-se e desabafe.

A visita acabou por voltar ao lugar, mas continuou em silêncio. O padre sentou-se a seu lado, pegou num rosário e principiou a rezar em surdina. Depois:

- Peço desculpa senhor padre, mas este não é o meu lugar… - teimou.

- Posso saber porquê?

- Porque há muito que me separei da fé, de Deus, da igreja…

- Isso pensa o meu amigo… E de tal forma está enganado que entrou assim… sem ninguém o chamar… Creio eu!

- Pois é verdade… mas continuo longe de crendices.

- Também eu… Mas crendices não é fé!

Voltou a baixar a cabeça e de repente romperam os olhos num mar pessoano. O padre aguardou que as lágrimas saíssem para voltar ao diálogo:

- Conte-me o que tanto o amargura?

- V… venho do hospital onde o meu filho de cinco anos acaba de falecer. Há seis meses foi diagnosticado com uma doença raríssima. Muitos tratamentos, mas nenhum deles mostrou ser eficaz. E hoje partiu…

- Lamento saber isso…

- A minha mãe era uma fervorosa católica. De tal forma que desde muito cedo fiz tudo o que poderia fazer: catequese, primeira comunhão, comunhão solene e só não fiz a crisma por já andar longe da fé! Será que agora estou a ser punido por isso?

- Nem por sombras. Não pense nisso! Deus é magnânimo…

- Então se o é, como diz, magnânimo, Ele que traga o meu filho!

O padre ergueu-se do banco e deu uns passos até à entrada. Depois olhou o Sol que se punha no horizonte e declarou com solenidade:

- A vida terrena é repleta de mistérios e incertezas. E nem tudo está nas mãos de Deus!

- Então está na mão de quem? Diga-me senhor padre.

- O que lhe irei dizer pode não ser o que gostaria de ouvir, mas o seu filho pode ser um instrumento de Deus.

- Como assim?

- O seu filho pode ser a estrela da sua vida.

- Que vida será a minha sem o meu rapaz?

Desta vez o padre aproximou-se do altar para dizer em tom de catequista:

- Quem nasce tem de partir um dia. Porém só Deus sabe quando será esse dia para cada um de nós. Hoje foi o seu filho, amanhã será o filho de outro desconhecido. Depois de amanhã o filho de outro qualquer. A sua dor é compreensível, mas mesmo não acreditando, como diz, num Deus acolhedor a partir de agora terá alguém a velar por si.

- A velar por mim? Coitadinho… nem por si soube velar!

- Engana-se, pois foi a luz divina do seu menino que o trouxe aqui a esta capela e ao pé de mim. Seria bom que nunca se esquecesse disso!

O retrato

Ergeu o olhar para o lado oposto da mesa, mas a cadeira, tantos anos ocupada, encontrava-se agora vazia. Cinquenta e cinco anos em conjunto! Mais de meio século. E os últimos anos haviam sido de suplício, luta permanente contra uma doença que teimava em evoluir drasticamente.

Lembrou-se da promessa de ambos feita muitos anos antes de qualquer enfermidade...

- Nunca me leves para um lar, quero morrer na minha cama   - pedira Adelina um dia.

Eduardo prometera que assim faria. E fez...

- Avô não comes?

A neta agitou-lhe a mão esquerda acordando-o daquele marasmo. Na mão direita a colher da sopa poisada no prato enquanto os pensamentos e as lembranças voavam.

- Sim minha querida, desculpa, estava distraído.

O avô fora sempre um exemplo para toda a família. A valentia, a corajem e a tenacidade haviam feito dele uma pessoa admirável e admirada. E a doença de Amélia viera mostrar quão forte era aquele homem.

- Agora pai, vai viver finalmente connosco? - perguntou a filha mais velha.

O velho recostou-se colocou as mãos em cima da mesa e como de uma sentença se tratasse, declarou:

- Meus filhos... A minha vida sem a vossa mãe jamais será a mesma. Por enquanto vou descansar dos anos que ela involuntariamente me brindou.

Uma lágrima correu pela ruga mais funda que Eduardo nem se preocupou em esconder. Continuou:

- Depois, se tiver saúde e alguma genica, vou visitar uns amigos que tenho longe...

- Onde meu pai?

- Não interessa. Eu sei onde eles estão e daqui a uns tempos vou lá passar um tempo.

- Vai sozinho?

- Achas que tenho medo? Mas continuando... antes de tudo isso aconteça vou deixar as coisas todas arranjadas para vocês, em termos de partilhas.

- Oh pai deixe-se disso... Ainda ontem sepultámos a mãe...

- Minha filha eu sei o que faço, acredita. Não tenhas medo... Mas as coisas são para ser resolvidas quanto antes.

A neta levantou-se abraçou o avô e finalmente disse inocentemente:

- Fico contente por ires viajar. Sempre gostaste disso.

O avô acariciou os cabelos sedosos da neta e exclamou:

- Viajar é sempre bom! - e esboçou um sorriso enquanto olhava o retrato da mulher quando nova, pendurado na parede do fundo.

"El sueño" de Frida Khalo

Resposta ao desafio da Fátima

 

Sonhei que tinha morrido.

Agora que estou de novo acordada, queria demais que o sonho fosse realidade.

Sonhei que tinha partido.

Neste momento em que olho para esta cama que me detém, queria sublimemente que aquele fosse verdadeiro.

Há quase trinta anos que descobri que tinha esclerose múltipla. Comecei por coxear, depois canadianas, mais tarde cadeira de rodas para agora aqui estar imóvel, a sonhar a todo o momento que a doce negra me leve e deixe, por fim, descansar quem cá fica.

Sei, no entanto, que ela paira algures por aí. Pode dormir comigo aqui a meu lado ou no beliche de cima, todavia ainda não teve a ousadia de me levar. Preciso outrossim de paz, necessito que aqueles que me rodeiam repousem destes anos de amarguras.

Porque eu…. eu já fui o que não sou agora. E sempre acreditei no milagre de uma suposta cura... Triste e pobre crença.

Sonhei que corria.

Para perceber que as minhas pernas hoje são mais empecilhos que alegrias. Que os meus braços são mais cepos que força.

Sonhei finalmente que vivia.

Morrendo!

 

No desafio Arte e Inspiração, participam Ana DAna de DeusAna Mestrebii yue, Célia, Charneca em Flor,  ConchaCristina AveiroGorduchitaImsilvaJoão-Afonso MachadoJorge OrvélioLuísa De SousaMariaMaria AraújoMarquesaMiaMartaOlgaPeixe FritoSam ao Luarsetepartidas

Poema de saudade

(Porque a Marta Elle nunca desapareceu!)

 

Não sei se me lembrei

ou se nunca te esqueci!

Sei apenas que não moras

entre nós há muito.

 

Rimos muito,

Escrevemos alguma coisa.

Trocámos palavras,

Porque te sabia presente.

 

Hoje és uma memória,

Recordação que se evadiu

Do meu coração

Para me fazer lembrar de ti

 

Poema pobre, este, sem rima

De quem se diz ser poeta.

Pobre escriba que sou

De coração cheio de saudades.

 

Tuas!

No meu jardim

Para ti Zé 

No pobre jardim,

que é a minha vida

Tu eras a flor,

mais alegre, viçosa.

Entre tantas

que por ali floriram

Foste sempre a pétala,

Mais brilhante.

 

Hoje és a saudade,

A lágrima tombada,

A tristeza de te ver

Ora partir.

Foste a certeza

Duma amizade.

Refém da pureza,

Presa no coração.

 

Partiste cedo demais

Pois que a hora foi

estranha, incerta.

Vai, vai companheiro

Abraça a barca,

De uma paz merecida.

Um sono eterno,

brando, mas atento.

 

Oh, quanto de mim,

Chorará… para sempre.