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José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

José da Xã

Escrever mesmo que a mão me doa.

21 dias na aldeia (8)

VII - Noite

 

Agora muda o tempo. Acabou o calor.

O dia foi tão quente quão ventosa é a noite!

E a noite escura e triste mete tanto temor,

Que a sair à rua, pouco há quem se afoite!

 

 

O vento sopra rijo. Vento frio, gelado,

Que mais frio é ainda, só porque vem do Norte.

E embora a noite assim, para alguns seja feia,

Para mim, triste, pobre desventurado,

Embora o vento sopre rijo, gelado e forte,

Ainda mais bela faz esta já bela aldeia!

 

Eu sou como Junquiero! Gosta da noite assim!

Luar! Estrêla! Vento, soprando a entrar em mim!

21 dias na aldeia (7)

VI - Crepúsculo

 

O sol vai-se a esconder, já para além da serra.

A noite tomba um véu sôbre o dia da terra.

 

Enxada ao ombro, volta o camponês ao lar.

Deixou de trabalhar.

"Agora, cavador, podes ir descansar!"

 

Os bois, puxando o carro, voltam à povoação.

Vêm mais ajoujados, o carro vem carregado.

E o boieiro à frente, também já vem cansado.

Agora já não canta, pica-os com o aguilhão.

 

A mulher pôs a mesa,

Acendeu a candeia.

E aquela luz na aldeia,

Inspira-nos tristeza!

 

O bébé acordou. Ei-lo agora abrincar.

O crepúsculo baixa! É a noite a tombar!

 

Nas paredes branquinhas, de branca e alva cal,

Já não se reflecte o quente sol de verão.

E a falta de luz na linda povoação,

Torna ainda mais bela esta noite estival.

 

Só luz dentro das casas. A pedregosa rua

Só é iluminada pelos clarões da lua!

21 dias na aldeia (6)

V - A aldeia

 

É tarde! O sol passou a linha do meio-dia.

A aldeia descança, digere o elimento.

Ah! Mas daqui a pouco, daqui a um só momento,

A aldeia acordará e acabará o dia

a trabalhar. Os homens, no campo, a fornear,

P'ra que o mato bravio não seque a oliveira,

Não lhe vá fazer mal, n~ºao a possa matar!

Elas ficam em casa, lá na lide caseira.

 

O camponês descansa e senta-se um pedaço

Naquele pedregulho ao pé da oliveira.

Quem dera fôsse noita e sentado àlareira,

A ver ferver a sôpa numa panela de aço.

Mas não! Não poderá voltar ao casario

Da aldeia onde vive, onde vê o seu lar.

Enquanto o seu trabalho ele não acabar,

Enquanto não queimar todo o mato bravio.

 

Ânimo camponês! Pega na tua enxada,

E destrói essa erva, essa amaldiçoada.

Trabalha camponês! Vê que o azeite é ouro,

E a erva matará todo esse teu tesouro!

 

E o cavador trabalha, sempre, até ao sol posto.

Vamos camponês! Em casa, a tua espôsa,

Olha que ela trabalha, olha que ela não gosa!

Ela também transpira o suor do seu rosto.

 

E a enxada sobe, a enxada desce!

O homem sua, a fôrça cresce!

Mas é preciso mais, muita força ainda!

É preciso uma enorme e bruta fôrça infinda.

 

A carripana avança, puxada pelos dois

Enormes e possantes animais de tracção.

Pelos carreiros estreitos, fora da povoação,

Lá vou, - chiando os eixos, - esse carro de bois.

E o condutor munido do aguilhão arisco,

Vai cantando, baixinhoe e num tom magoado.

E diz, para animar o gado tão carregado:

"Anda lá Galhardo! Para a frente Mourisco!"

 

E os bois mansos lá seguem pelo carreiro adeante.

- Carreiro estreito e mau onde falta o betume,

Onde as pedras são soltas, onde o carro passante

Parece ir a tombar com os balanços que dá,

Onde os cascos dos bois fazem raios de lume!

Mas o boieiro é firme, atento e vigilante!

 

Vede a mulher além, nessa casa branquinha,

Agora lava a loiça ou arranja o jantar,

Para que o marido, no fim de trabalhar.

Possa em paz descançar, dizer em voz baixinha:

"Obrigado mulher! Tu és a minha vida,

Tu és a espôsa santa, tu és a espôsa querida!"

 

E enquanto a mãe trabalha no arranjo do lar,

Enquanto o pai trabalha no campo, entre o pó,

O bébé descansando, no berço, a dormitar,

Face côrada e linda vai fazendo o ó-ó.

 

E a mãe coitada, e sem deixar de trabalhar

Canta baixinho. A voz serve para embalar.

E um raio de sol entrando pela janela

Do quarto do menino bonito e rosado

Não resiste e ao ver a sua face bela,

Vem mui devagarinho deitar-se a seu lado.

 

"Mas vem raio de sol, lento e devagar!

Cuidado não vás tu o bébé acordar!"

 

As paredes branquinhas, de brance e alva cal

Reflectem, como espelhos, o quente sol de verão,

A dar luz e calor à linda povoação,

A tornar mais bonita esta tarde estival.

 

21 dias na aldeia (5)

IV - Esquecimento

 

 

Vive 'inda em minha mente aquele dia

Em que te conheci ó terra bela!

Povoação tão humilde, tão singela,

Como outra, até aí não conhecia.

 

 

Minto! Que não foi essa a minha ideia!

Porque era noite, e a lua já raiava.

E como eu a paisagem não olhava,

Então, ó terra bela, achei-te feia!

 

 

Passou o tempo e apareceu o sol.

Amanheceu. A montanha imponente.

Refectia em sua encosta descente

Os raios da estrêla, do farol!

 

 

Subi à alpendrada e olhei a paisagem.

Na véspera, de noite, eu vira a fealdade!

Agora, de manhã, não sentia saudade

Da terra que deixara. Parecia-me miragem.

 

 

E eu que amava Lisboa! Como eu a achava linda!

Quando eu a deixava, ó que saudade infinda!

Uma tristeza grande, enorme, me invadia!

Eu amava Lisboa! Fôsse noite ou dia.

 

 

 

Tu tinhas para mim o encanto da cidade,

Da terra onde nascera, dessa terra natal

Que eu idolatrava, com enorme amizade.

Eu amava Lisboa! Amava - por meu mal!

 

 

 

Um dia saí dela! Nos primeiros momentos

Recordava sentido aqiuela imensa mole

De prédios, de ruas. de estátuas, monumentos!

Recordava Lisboa! Recordava o seu sol,

 

 

 

A noite luarenta, a manhã buliçoza.

Ospregões das varinas, bpnitas, malcriadas!

Recordava Lisboa! Sua alma vaidosa,

A qual se revelava por fora, nas fachadas!

 

 

E agora eu te deixei!

Por outra te troquei,

Ó Lisboa esquecida!

Foi bom eu te olvidar,

Porque aprendi a amar...

... E vivi outra vida!

 

 

Minha terra natal! Esquecida Lisboa!

Eu peço-te perdão! Eu rogo-te: perdoa!

21 dias na aldeia (4)

III - Prelúdio

 

Eu sou como Junqueiro! Gosto da noite assim!

Luar! Estrêlas! Vento, soprando, a entrar em mim!

 

 

Por isso, ó Vento amigo, ó noite encantadora,

Ó estrêlas que bailais, ó luar fugitivo,

Animal que vigiais, ó alma de poeta,

Fazei que me invada a mesma poesia

Que invadiu Camões, o Épico imortal!

Fazei que me inspire a mesma musa amiga

Que inspirou Junqueiro, o mago rimador,

Que transformou Bocage no Elmano divino

E que fez de João o poeta infantil!

 

 

Sei que não serei célebre, como foi o amões,

Como o foi Junqueiro e como o foi Elmano,

Como João de Deus e tantos outros.

 

 

Mas eu desejo e quero mostrar ao mundo enorme

Que as musas me inspiram que o meu estro não dorme!

 

 

Quero mostrar às gentes, que no planeta existe

Num recanto da terra um pobre, um miserável,

Talvez homem no corpo, criança no pensar,

Que nunca foi ingrato, que sabe agradecer

Aos que o acolheram como se um seu filho ele fôra.

E quero agradecer à terra pequenina,

De poiuco casario, de gente hospitaleira,

Que um dia o recebeu e sustentou uns dias.

 

 

Por isso, ó Vento amigo, ó noite encantadora,

Ó estrêlas que bailais, ó luar fugitivo,

Animal que vigiais, ó alma de poeta,

Ajudai-me a cantar, embora em versos pobres,

A gente acolhedora, a terra carinhosa.

Onde eu repousei das agruras da Vida.

 

 

E eu te agradeço a ti, ó Vento amigo!

E eu te agradeço, ó noite encantadora!

E eu vos agradeço, estrêlas que bailais!

E eu te agradeço, ó luar fugitivo!

E eu te agradeço, animal que vigiais!

E eu te agradeço, ó alma de poeta!

 

 

Benditos sejam!

 

 

 

 

 

21 dias na aldeia (3)

II - Poeta

 

A versejar rimas pobres,

A pobres versos rimar.

Ah! Vós, poetas bem nobres

Bem me podeis condenar!

 

 

Que sou eu? Um visionário,

Um louco, um sonhador.

Um doido extraordinário,

Mísero versejador!

 

 

Para quê? Porque tentar

Os poetas imitar?

 

 

É o vento forte soprando...

É a oliveira vibrando...

As estrêlas cintilando...

 

 

É a alma versejando

Que assim me faz pensar...

É a minha alma inquieta

que me faz pobre poeta...

 

 

21 dias na aldeia (2)

 

I – O Vento

 

Um raio de luar espreita a povoação

Por detraz do cabeço, orgulhoso e altivo

Quere saltar o monte alto, deixar de ser cativo,

Ultrapassar as grades, ser livre da prisão.

Há estrelas também! E há também o vento.

Que as faz bailar lá em cima no escuro firmamento!

 

E sopra o vento forte! E espreita o luar!

E bailam as estrelas brilhando, a cintilar!

 

Soa ao longe um latido dum cão bem vigilante.

Que é? Se não é gente que vem para roubar!

É nos ramos da oliva o vento a perpassar

A fazê-los tremer, num trémulo vibrante.

 

E o vento que acorda o bom do cão amigo,

Que faz tremer os ramos das olivas despertas

É ‘inda o mesmo vento, o mesmo Eolo antigo

Que nos antigos tempos levou às descobertas,

Que levou os heróis, por esse mar além,

A construir impérios e estradas abertas

Aos humanos gentios da nossa pátria-mãe.

 

É esse mesmo vento que numa hora calma,

Me incita a versejar e acorda a minha alma!

 

 

21 dias na aldeia - Introdução (1)

Os poemas que a seguir publico não são da minha autoria. Assina o autor como Eduardo Monteiro – nem sei se é algum pseudónimo. Encontrei estes textos no meio de papéis muuuuuuuuito velhos. Datam de Setembro de 1946.

 

Publico-os porque lhes achei muita graça e faço-o tal e qual o manuscrito. Com eventuais erros ortográficos (ou não!!!).

 

Acabei por incluir fotos dos originais do textos.

 

 

Introdução

 

Maria, não digas nada

Eu te peço o grande favor

Um cajado e uma pedra

São as armas, ai! do pastor!

                            

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Editado no dia 7 de Julho de 2014